«Agradava-me a ideia de ser morto na China dentro de um junco ancorado, diante de um velho fotogénico, no meio de uma atmosfera chinesa saturada de maus cheiros, fumo e peixe frito, de tabaco, petróleo e água suja. Afinal fora para isso que eu viera, para acabar com tudo, para estar algures fora de tudo e a tudo pôr termo. Os médicos tinham‑me concedido pouco tempo antes do começo dos sofrimentos a sério. Eu tinha previsto abreviá‑los por mim mesmo, abreviar essas irreversíveis degradações do corpo. Não é que ser assassinado por engano me fosse de todo indiferente. Claro que havia uma certa dose de injustiça nesta história toda, algo que à última hora me poderia ter deixado uma certa amargura.»
Antoine Volodine é o pseudónimo mais conhecido de um dos mais destacados escritores franceses contemporâneos. O seu romance Des anges mineurs foi galardoado em 2000 com o Prémio Inter. A sua identidade literária múltipla, com três heterónimos (Manuela Draeger, Elli Kronauer e Lutz Bassmann), cruza-se com uma obra misteriosa, de ressonâncias beckettianas, que aborda os males do nosso mundo em sociedades nebulosas e irreconhecíveis, onde é dada voz aos mortos e aos sobreviventes (ou resistentes). Quase quinze anos após a publicação de Le port intérieur, livro ancorado nas mesmas paragens do mar da China, Antoine Volodine reencontra essa paisagem familiar: as ruelas escuras de Macau, a humidade sórdida, a noite onde monologam personagens ambíguas e sem futuro. E um novo livro, o seu primeiro em Portugal, se junta à vasta construção romanesca que encetou em 1985 e que conta hoje com mais de trinta títulos.
Olivier Aubert vive com máquinas fotográficas há cerca de vinte anos. Utiliza-as para fazer explorações, reportagens, inquéritos, retratos. Trabalhou até hoje numa trintena de países, uma grande parte dos quais em África e na Ásia. A sua obra está representada em numerosos museus franceses.
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