Homem lúcido e sempre racional, o Barão de Teive - mais um dos semi-heterónimos de Fernando Pessoa - escreve sobre as suas razões para a incapacidade de terminar uma obra e aponta as suas últimas reflexões, antes de pôr fim à vida. Em fragmentos, claro. Fragmentos que reflectem a sua incapacidade de superar os excessos de racionalidade, de se reconhecer em sentimentos e que, por isso (ou tudo assim indica) se descobre incapaz de se realizar, quer numa possível relação, quer numa criação completa e satisfatória. A Educação do Estóico apresenta esse quase testamento de reflexões fragmentadas sobre a arte inacabada.
Semi-heterónimo, porque não é difícil reconhecer nele partes da personalidade do "verdadeiro" Pessoa, o Barão de Teive é, ainda assim, uma figura com identidade própria. Isso é facilmente identificável neste conjunto de fragmentos, seja na história que é atribuída à sua linhagem, seja a acontecimentos como a operação a que foi submetido ou às suas proclamadas acções antes da morte. Ainda assim, os paralelismos com outras ideias de Pessoa ou de outros heterónimos são evidentes, o mesmo acontecendo com os rasgos de genialidade, comuns às diferentes identidades.
Este manuscrito de Teive é essencialmente uma reflexão sobre si mesmo e sobre os elementos que definem a sua identidade. Assim, é interessante reconhecer traços de uma história - a do próprio Barão, claro - por entre os pensamentos sobre a vida, a arte e a capacidade de criar ou a falta dessa capacidade. Nas suas reflexões, o Barão surge como uma personagem na sua própria história, uma história que se funde com inúmeros fragmentos de pensamento, mas que se vislumbra, ainda assim, a dar algo de real a essa forma de pensar.
Basta toda esta questão de identidades para tornar este livro interessante. Mas, além das considerações sobre autor imaginado e autor real, há ainda as reflexões em si. E no pensamento de Teive há inúmeras questões interessantes, todas elas abordadas numa perspectiva que é muito pessoal, mas que - seguindo as bases da caracterização do seu autor - é, também, sempre racional. Há muito para reflectir nestes fragmentos de análise sobre a vida e a arte, e estas questões são potenciadas pela genialidade das palavras. São várias as frases que ficam na memória - e o mesmo acontece com as questões que evocam.
Trata-se, assim, de um livro que, apesar de relativamente breve, apresenta inúmeras questões relevantes a considerar. E fá-lo pela voz de uma figura tão complexa como os aspectos que considera, e numa forma de escrita igualmente fascinante. Vale a pena ler este pequeno livro, portanto. Muito bom.
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