Retrato de um Alentejo povoado de miséria, esta é a história dos homens que buscam trabalho e que, humilhados na sua dignidade, se revoltam, para se verem consumidos sob uma nova opressão. É a história de uma autoridade a quem muito é permitido, inclusive olhar apenas para onde pretende e impor-se a todos os que não a podem contestar. É a história, ainda, de um velho cheio de sonhos e de uma jornada em direcção à dura realidade. História de um tempo, em suma, e das suas gentes, na sucessão de episódios e rotinas que lhes definem as vidas.
Relativamente breve, mas com um conjunto bastante vasto de personagens, este não é um livro que se defina por uma linha narrativa precisa, com um único protagonista, mas antes por um conjunto de episódios em que várias personagens se destacam. A história é, no fundo, a de um lugar num ponto definido do tempo e, por isso, o rumo da narrativa oscila entre diferentes personagens em diferentes circunstâncias, sendo o ponto comum a origem e o cenário, mas com diferenças entre si. Assim, o que é apresentado é uma sequência de acontecimentos relativos a diferentes personagens, aparentemente com poucas relações entre si, mas que, no fim, se conjugam para formar um retrato global, que é o da miséria do lugar e da forma como esta se reflecte nas diferentes almas que o povoam.
Ora, com todas estas personagens e acontecimentos diferentes, não surpreende que nem todas as circunstâncias encontrem uma conclusão definitiva. Não parece, aliás, ser esse o objectivo. Ao deixar em aberto partes da história, cria-se uma impressão de continuidade, de que a história (ou histórias) narradas é simplesmente uma parte da mais vasta realidade. E, apesar da curiosidade que fica por satisfazer, esta impressão acaba por ser, na verdade, parte do que torna a leitura tão interessante. É que, marcantes pelo que são, mas também pelo que representam no todo, todos os episódios contribuem para esse retrato de tempo e lugar que é, no fim de tudo, o que fica na memória. A história das gentes passa, mas a terra continua lá e, por isso, haveria sempre mais para contar.
A ideia que fica, então, deste O Hóspede de Job é a de uma história de contrastes, em que a brevidade e a simplicidade das situações se opõem à vastidão do lugar e das complexas relações a ele associadas. Por isso, bem como pelo impacto dos momentos que dão forma a este retrato global, vale a pena, sem dúvida, ler este livro.
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