Peter Schoeffer tem um futuro promissor à sua espera no ofício de escriba e tudo para fazer jus ao seu lugar. Mas tudo muda quando o pai adoptivo o chama de volta a casa. Johann Fust conheceu um homem invulgar e a invenção revolucionária que este lhe apresentou promete mudar o rumo da produção de livros. Por isso, e já que vai investir nessa invenção, quer o filho envolvido no processo. Peter não tem escolha. O dever exige-lhe que cumpra a vontade do pai. Mas o que começa por ser uma resignação relutante rapidamente se converte em assombro ao ver as verdadeiras potencialidades do engenho de Gutenberg. O caminho será duro, ainda assim, e o sucesso é uma meta distante. E Peter pode muito bem estar no meio de uma terrível tribulação.
Não é fácil explicar o que tem este livro que tão facilmente se torna fascinante. Talvez a evolução dos acontecimentos, talvez a forma como a autora dá vida à história que tem para contar... Talvez até a soma de todas as partes. Mas há um aspecto que fica da leitura que é particularmente impressionante e que, por isso, é o primeiro que quero destacar neste livro cheio de qualidades: a posição do protagonista perante a história de que é o centro. Peter Schoeffer não se torna aprendiz de Gutenberg por vontade própria e, muitas vezes, o seu caminho é imposto em vez de escolhido. Ora isto, este percurso guiado por deveres e imposições desperta, desde logo, uma certa empatia para com o protagonista, principalmente tendo em conta os traços mais desagradáveis daqueles que lhe orientam os passos.
Esta situação é, claro, um bom ponto de partida para despertar curiosidade. Relutante em aceitar o seu destino, mas forçado a isso, Peter é uma personagem que se revela, desde logo, na forma como lida com as suas circunstâncias e isso torna-o especialmente intrigante. Além disso, o evoluir dos acontecimentos realça as suas melhores características, a força escondida nas suas circunstâncias, e isso é uma parte muito importante da alma desta história.
Mas nem só do protagonista vive o livro, nem mesmo das personagens que o rodeiam. Claro que há muito de interessante nessas personagens, a começar, desde logo, pelo estranho temperamento de Gutenberg e pela luta constante que define a sua sociedade com Fust. Mas há também todo um contexto histórico, um percurso de mudança... E uma longa e penosa jornada rumo a um objectivo, jornada essa em que tudo é fascinante - as tentativas, os planos, os fracassos, os sobressaltos. E as pequenas grandes traições.
E toda esta história é construída num equilíbrio também fascinante, em que tudo é desenvolvido na exacta medida em que é importante para a história. O contexto histórico, os avanços e retrocessos na produção da Bíblia, a posição de Peter em tudo isto e o turbilhão emocional em que, por vezes, a sua vida se transforma. Afectos, anseios, acções... Tudo se conjuga num equilíbrio perfeito, abrindo caminho para um final que é também fortíssimo... e mais que adequado.
Eis, pois, um livro em que tudo é memorável. Muitíssimo bem escrito, com um protagonista fascinante e uma história onde tudo se enquadra na perfeição, cativa desde muito cedo e não deixa de surpreender até ao final. E é isso - bem como a soma de todas as pequenas coisas que formam parte desse todo - que me leva a recomendar este livro tão fascinante. Sem hesitar.
Título: O Aprendiz de Gutenberg
Autora: Alix Christie
Origem: Recebido para crítica
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