Oliver e Alice parecem ter uma vida feliz. Ele é um escritor de sucesso, ela é a ilustradora dos seus livros. Dão-se bem, ainda que as ideias fixas que Oliver tem para o que quer da vida pareçam impor uma certa desilusão. Mas, de repente, tudo muda. Uma noite, num acto inexplicável, Oliver espanca violentamente a mulher, deixando-a em coma. Não parece haver nada capaz de justificar um tal acto e o próprio Oliver parece não entender bem porque o fez. Mas, à medida que todos - vizinhos, antigos colegas, familiares - recordam o passado, um padrão começa a emergir: o de alguém que fez que a vida e as suas próprias escolhas o transformassem num monstro.
Contado na primeira pessoa, mas por um vasto conjunto de personagens, este é um livro que quase funciona como um puzzle, na medida em que, através de cada ponto de vista, é possível recolher mais uma peça para a descoberta da verdadeira natureza de Oliver e da sua história. O que acontece, por isso, é que a história parece construir-se através de um conjunto de momentos que se vão encaixando num todo, revelando não só os mistérios do passado, mas também as bases da personalidade de Oliver e daquilo que o levou aos seus mais terríveis actos. Do que resulta uma aura de mistério sempre presente, sempre intrigante, e que, passo a passo, vai abrindo caminho a novas e surpreendentes revelações.
Tudo isto acontece de forma gradual, a um ritmo que, não sendo propriamente compulsivo, cativa desde muito cedo e nunca deixa de prender. E para isso contribui em muito a construção das personagens e a forma como a autora as retrata, realçando, de diferentes perspectivas, tanto as qualidades como as imperfeições.Oliver é o máximo exemplo disso, com a história do seu passado a moldá-lo no homem do presente, mostrando-o tanto como a pessoa capaz das coisas mais terríveis quanto como o menino isolado e rejeitado sem saber porquê.
Isto desperta sentimentos ambíguos, não para com a história, mas para com as personagens, que tanto conseguem despertar compaixão como repulsa, consoante o que fazem, o que pensam ou a forma como quem está a contar a história nesse momento as vê. E isto acaba por ser um dos traços mais fascinantes desta história, pois, em toda a inocência como em toda a crueldade, ninguém é inteiramente perfeito nem inteiramente monstruoso, tendo todas as personagens uma base que os leva ao que são. E assim tudo converge numa história cheia de segredos e de surpresas, em que os porquês são mais importantes que o quem.
Intrigante, muito bem construído e com uma construção de personagens fascinante, trata-se, pois, de um livro que cativa desde muito cedo. E que, de memória em memória até à revelação final, nunca deixa de surpreender. Recomendo.
Título: O Segredo do Escritor
Autora: Liz Nugent
Origem: Recebido para crítica
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