Imaginem um mundo em que tamanho e riqueza são a mesma
coisa. Os mais ricos são gigantes. Os mais pobres, mais pequenos que ratos. E a
única forma de crescer é, claro, enriquecer. Warner e Prayer estão entre os
mais pequenos e sempre à procura de uma vida melhor. Mas como é que se consegue
isso, sem saber ler, sem poder aprender, quando se leva séculos a chegar de um
lado ao outro e basta um passo errado de um dos mais ricos para se acabar morto
de uma forma bastante desagradável? A situação é desesperada – mas a cabeça de
Warner está cheia de planos. E, com um pouco de sorte, alguns desastres pelo
caminho e a estranha magia dos seus sonhos, ele começa a construir um caminho
para si e para a sua família.
Inesperado em todas as suas facetas, desde a estranheza do
mundo onde tudo acontece às escolhas morais ambíguas de todas as personagens,
esta é uma história que, apesar de muito diferente do mundo real, tem muito em
comum com a realidade quotidiana. Aos mais ricos, tudo é permitido. Aos mais
pobres, nem sequer uma oportunidade. E, nesta visão de um mundo de grandes
ricos e pequenos pobres, de banqueiros e serviços e políticas que parecem
manter tudo sempre no seu lugar – lugar esse que é, naturalmente, definido
pelos mais ricos – há todo um mundo de temas e questões relevantes. E uma visão
bastante sombria, mas também bastante perspicaz, da nossa própria realidade.
Dado este cenário, não se pode realmente esperar uma
história limpa, e muito menos um simples final feliz. Mas também isso faz parte
do que torna tudo tão intrigante. Warren e Prayer estão a lutar pela vida, mas
viver no seu mundo implica tristeza e raiva e amargas desilusões. E há algo de
particularmente impressionante na forma como o autor torna estes sentimentos
tão nítidos. Além disso, há um contraste notável entre o mundo dos sonhos e o
mundo real, e muita criatividade e possibilidades, o que torna muito mais
impressionante quando os sonhos vastos e brilhantes dão lugar a uma realidade
tão sombria.
Nada é perfeito nesta história – e é isso que a torna tão
única. E, se há personagens e atitudes que são difíceis de entender, e gente
que fica para trás no meio de todas as mudanças... bem, faz algum sentido. A
vida não é perfeita nem simples. E nunca seria possível alcançar um fim
perfeito e bonito no mundo de Warner. Por isso, parece apenas adequado que haja
um fracasso para cada sucesso – e que nunca nada termine em perfeição.
Peculiar, mas com muito em comum com a realidade actual, a
soma das partes é uma história de personagens imperfeitas num mundo igualmente
imperfeito – capazes do melhor e do pior, mas sempre a tentar chegar a um lugar
melhor. Intrigante e inesperada, uma boa leitura.
Título: Munmun
Autor: Jesse Andrews
Origem: Recebido para crítica
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