quarta-feira, 26 de setembro de 2018

O Mistério dos Três Quartos (Sophie Hannah)

Ao chegar a casa após um almoço deveras agradável, Poirot vê o seu dia piorar irremediavelmente. Uma mulher transtornada acusa-o de lhe ter escrito uma carta onde ele a acusa a ela do homicídio de um homem. Ora, Sylvia Rule não conhece esse homem - nem é a única acusada. Seguem-se outras três cartas igualmente desagradáveis e o resultado... bem, o resultado é o esperado. Poirot vê-se impelido a investigar a subitamente misteriosa morte de Barnabas Pandy e a examinar a história dos quatro acusados. E é aí que as revelações começam a ganhar forma.
Um dos primeiros aspectos a destacar neste livro, principalmente para quem, como eu, ainda não tiver lido mais nenhum destes novos mistérios de Poirot, é a facilidade com que o registo parece ajustar-se aos originais escritos por Agatha Christie. São histórias novas e portanto tudo é novo - mas Poirot é o mesmo e, portanto, o seu método de actuar também o é. A sensação é, por isso, a de um agradável regresso a um local familiar - quer se goste mais ou menos das outras aventuras do famoso detective belga.
Claro que outro dos grandes pontos fortes é... bem, o próprio Poirot. Com a sua excentricidade e as suas eficazes celulazinhas cinzentas, faz de cada caso uma revelação, e este mistério não é excepção. Desde as invulgares comparações com um certo bolo à decisiva revelação final, há nas grandes e nas pequenas coisas todo um conjunto de qualidades que tornam a leitura irresistível. Além disso, o caso propriamente dito é todo ele cheio de surpresas e todas as outras personagens têm também muito de interessante.
E há ainda uma última faceta especialmente notável: é que, sendo embora um caso específico e de natureza relativamente particular (envolvendo essencialmente afectos, amores e vinganças), há, ainda assim, um grande tema subjacente que, embora abordado num estilo discreto que agradaria decerto ao próprio Poirot, não deixa de ter o seu devido destaque. É que há entre as personagens um defensor feroz da pena de morte e um igualmente feroz opositor. E, claro, se comprovado o homicídio, será esse o resultado expectável. A forma como a autora aborda esta divergência de posições e a influência que o caso tem na opinião das personagens acrescenta ao enredo uma nova camada de complexidade - além de reforçar o impacto da conclusão. 
Trata-se, pois, do mais agradável dos reencontros: uma história intrigante e cheia de surpresas, protagonizada por uma figura tão peculiar quanto fascinante e em que as motivações acabam por ser tão importantes quanto o acto em si. Viciante, surpreendente e com um belíssimo final, um livro que não posso deixar de recomendar. 

Autora: Sophie Hannah
Origem: Recebido para crítica

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