sexta-feira, 22 de março de 2019

Flores sobre o Inferno (Ilaria Tuti)

A inspectora Teresa Battaglia encontrou no trabalho a melhor forma de lidar com os seus monstros interiores, pois, ao contrário dos outros, ela vê o inferno escondido sob as flores. Mas agora, aos sessenta anos, o corpo e a mente começam a traí-la no momento em que mais precisa de toda a sua lucidez. Um corpo foi encontrado numa pequena aldeia nos Alpes e o caso é algo nunca antes visto. Tudo aponta para um assassino em série, mas há partes que não batem certo. E, embora não faltem pistas forenses, o assassino move-se pela floresta como se da sua casa se tratasse. É preciso travá-lo... mas como? E que explicações pode haver para um comportamento tão incoerente - mesmo se visto do ponto de vista da patologia?
Um dos primeiros aspectos a chamar a atenção nesta história - e também uma das suas principais qualidades - é a peculiaridade da protagonista. Quando começamos a ler um policial, dificilmente esperamos que a figura central da investigação seja uma mulher frágil de sessenta anos cuja memória começa a falhar. Mas é precisamente esse o primeiro ponto a despertar para o fascínio de Teresa Battaglia: uma mulher fisicamente frágil, sim, mas dotada de uma perspicácia sem paralelo e com uma história pessoal que, embora abordada sempre de forma relativamente velada, realça o delicado equilíbrio entre as suas forças e vulnerabilidades.
Bastaria, pois, esta protagonista invulgar para fazer com que a leitura valesse a pena. Mas há mais. É que a história, o caso que está no cerne de toda esta investigação, é toda ela cheia de surpresas, desde os meandros de um passado sombrio envolvendo uma experiência macabra à estranheza das grandes descobertas, capazes de dar uma nova perspectiva a todo o percurso do assassino. Sem esquecer, claro, as peculiaridades dos relacionamentos fechados que unem a comunidade, gerando uma tão grande aversão ao exterior que a justiça e a necessidade de proteger vidas conseguem até ficar para trás na mente de alguns.
No fundo, o que se passa é que há um conjunto de elos que, somados, formam um todo complexo e surpreendente. Mas surpreende também a naturalidade com que estes elos se conjugam: a vida pessoal de Teresa (e a sua curiosa relação com o seu mais novo subalterno), a história do assassino e das experiências que o moldaram, os passos dados na investigação e até o ponto de união entre as diferentes vítimas, tudo isto forma uma teia intrincada, mas em que cada elemento é fácil de acompanhar. Porque tudo é interessante, claro, mas também porque a escrita tem uma fluidez que faz com que tudo pareça natural.
É esta sensação de equilíbrio que fica na memória, depois de terminada a leitura: de um equilíbrio delicado e eficaz entre um caso que se abre e resolve de forma adequada (e profundamente marcante, diga-se de passagem) e um percurso pessoal que promete ainda muito mais para desvendar. Vale, pois, a pena conhecer Teresa... e também Marini. E também esta história surpreendente e memorável.

Autora: Ilaria Tuti
Origem: Recebido para crítica

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