Derek Ouelette pode ter sido, em tempos, um jogador famoso, mas os seus dias de glória acabaram. Agora, vive essencialmente dividido entre o álcool e as lutas constantes com aqueles que o provocam. Mas também isso está prestes a mudar, com o regresso de Beth, a sua irmã, que regressa à sua terra natal para fugir ao namorado abusivo e ao vício das drogas que continua a trazer consigo. Numa tentativa de lidar com a situação, e com os mais recentes problemas que Derek arranjou, ele e a irmã escondem-se numa cabana isolada. Mas o mundo não parou e o namorado de Beth não desistiu dela - o que significa que, mais cedo ou mais tarde, o conflito terá de acontecer.
Parte do que torna esta leitura tão marcante é a capacidade de gerar sentimentos intensos por um protagonista cujas características mais destacadas são os defeitos. Com a sua propensão para reagir com violência e a vida perdida entre o álcool e as deambulações, Derek não é propriamente do tipo que gera empatia imediata, mas, à medida que a história se desenrola e as marcas do passado vêm à superfície, gera-se uma impressão bastante diferente. Derek, tal como a irmã, é, em grande medida, o resultado do passado que o moldou. E esta percepção, associada à sua faceta protectora e à profunda melancolia que o envolve, mostram um Derek bem mais humano e digno de compaixão.
Também particularmente interessante é a forma como esta profunda melancolia se torna tangível em termos visuais. Sendo uma história maioritariamente de diálogos sucintos, e em que os percursos isolados desempenham um papel fundamental, é apenas natural que a arte ganhe destaque. Mas, mais do que o traço propriamente dito, fica na memória o poderosíssimo impacto da cor, com o azul predominante a reflectir a desolação geral, interrompida pelos rasgos de cores quentes que reflectem memória e tumulto. Até as próprias expressões, não muito pormenorizadas, mas muitíssimo eloquentes (e note-se que isto não se aplica apenas a expressões humanas) reflectem com precisão as emoções e ambiguidades das diferentes personagens.
E importa ainda voltar à história para referir o final. Sendo moldado, em muitos aspectos, pela violência, é expectável que o derradeiro confronto implique uma certa medida de agressividade. Já a forma como esta se concretiza é, além de bastante inesperada, perfeita para o percurso do protagonista. A capacidade de Derek de, com toda a sua história, tomar a decisão certa para resolver, de uma vez por todas, o problema que se avolumava diz muito também da verdadeira complexidade da personagem. Não é apenas o rufia que afirma ser no início - e essa percepção é um dos aspectos mais brilhantes deste livro.
Feito de sombras profundas e de corações que - apesar de tudo - continuam no sítio certo, trata-se, pois, de uma história que, apesar de ambígua nas suas emoções, nunca deixa de transmitir força. Intenso, contrastante e profundamente humano, um livro que fica na memória... pela melancolia e pela emotividade.
Título: Roughneck - Um Tipo Duro
Autor: Jeff Lemire
Origem: Recebido para crítica
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