Presos na Quinta há demasiado tempo e separados de tudo o que em tempos os fez avançar - tudo excepto uns dos outros, claro - os heróis de outrora parecem ter-se resignado à sua condição de prisioneiros. Mas eis que chega uma visitante do mundo exterior, alguém que eles conhecem e que vem à procura do Black Hammer. Lucy só quer saber o que aconteceu ao pai, mas está agora tão presa como os outros, mas ainda mais confusa, pois não entende muito bem os seus sentimentos. Não está, porém, disposta a resignar-se como os outros e, à medida que procura respostas e o passado começa a vir à superfície, Lucy descobre mais do que as memórias que perdeu. Descobre a promessa de um futuro.
Há algo de fascinante neste estranho contraste de uma história em que os super-heróis não parecem já ser muito heróicos. Presos num lugar inexplicável, cada um dos heróis tentou reconstruir a sua vida, dentro dos possíveis, através de relações ou de isolamento, de resignação ou de revolta. E esta percepção de uma vida para lá dos seus dias áureos tem o condão de humanizar as personagens, além, claro, de criar um contraste poderoso entre as memórias do passado - que incluem naturalmente grandes cenas de acção e de combate - e a inexorável tranquilidade da Quinta.
É um percurso que vem já do volume anterior, mas que ganha aqui novos contornos. A entrada em cena de Lucy lembra que o mundo não acabou, despertando novos planos de fuga e, consequentemente, novas suspeitas. Assim, gera-se também outro equilíbrio: entre as memórias do passado, que ocupam grande parte deste segundo volume, e as possibilidades futuras, que envolvem alguns segredos e intrigas e também um grande desenvolvimento final que promete ainda novas revelações. Os dias de glória das personagens não contrastam apenas com a resignação presente. Realçam também os segredos que persistem apesar da convivência - e que implicam que nem tudo é exactamente o que parece.
E, sendo uma história em que tudo contrasta, também na parte visual sobressaem os equilíbrios. O passado de glória transborda de cor e de movimento, contrastando com a relativa tranquilidade da Quinta. Mas as fronteiras vão-se gradualmente esbatendo. Além disso, a presença de Lucy e a sua relação com as palavras acrescentam também uma nova forma de expressão e um novo ponto de contraste, que se manifesta não só nos tons nostálgicos que a envolvem, mas também nas suas próprias expressões.
Proximidade e isolamento, acção e silêncio, movimento e introspecção. Contrastes e equilíbrios, em suma. São estes os elementos centrais de um segundo livro que, expandindo a história para o passado e para o futuro, abre portas a novas relações e revelações - e promete ainda muitas mais surpresas. Intenso, surpreendente e inesperadamente emotivo, um segundo volume ainda mais memorável e equilibrado que o primeiro. Muito bom.
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