sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Armazém Central: Ernest Latulippe | Charleston (Régis Loisel e Jean-Louis Tripp)

Notre-Dame-des-Lacs sempre foi um sítio pacato... até ao dia em que as coisas começaram a mudar. Agora, há tensões no ar e dúvidas acerca do futuro. A partida de Marie para Montreal, sem qualquer indicação de quando poderá regressar, deixou os habitantes em alvoroço. Uns acham que é apenas justo. Outros sentem a sua falta. E todos começam a ver que a vida sem o armazém é mais difícil do que julgavam. Esperam que ela volte, e em breve. Mas uma coisa é certa: Marie até pode voltar de Montreal, mas levará consigo um pouco da nova liberdade que acaba de descobrir...
Chegados ao sexto e sétimo episódios desta série, existe já um conjunto de características que são, à partida expectáveis: o cenário vasto e tranquilo onde tudo acontece, o meio pequeno e coeso, onde todos sabem tudo e todos têm uma opinião a dar sobre todos os comportamentos, a forma como a mudança é interpretada como uma ameaça, para depois se revelar como algo diferente... É esta, de certo modo, a base de todos os volumes anteriores, e este não é exceção. Partidas e regressos, mudanças e reencontros e a introdução de novos elementos num cenário onde tudo muda, sem nunca perder de vista a base essencial.
Algo que também nunca deixa de cativar nestes livros é que, sendo embora uma história muito específica passada num espaço muito singular, tem, ainda assim, algo de comum a todos os meios pequenos. A união e a entreajuda quando alguém precisa, em contraste com a inevitável circulação de boatos e falatórios sempre que algo ou alguém não está de acordo com os padrões convencionais; a forma como certos locais se tornam ponto de encontro para toda a comunidade; e claro, a proximidade de um meio onde todos se conhecem. É uma história específica, mas onde é fácil reconhecer pontos de familiaridade, o que a torna ainda mais próxima. Além disso, sendo uma história que vive mais das relações entre as personagens do que dos grandes momentos, embora também os haja, esta afinidade emocional torna-se especialmente marcante.
É ainda - o que, aliás, é apenas expectável - uma história que vive tanto da imagem como da linguagem verbal. Claro que não faltam momentos notáveis no diálogo, que tem também as suas singularidades, mas há como que uma alma especial na vastidão dos cenários, na expressividade dos rostos e até na presença discreta, mas sempre oportuna, dos vários animais ao longo da história, que acrescentam um delicioso laivo de ternura. É como se a vida das personagens transbordasse das páginas - ao ponto de alguns dos momentos mais marcantes serem aqueles em que não há diálogo nenhum.
É sempre um prazer regressar a esta aldeia e à sua comunidade coesa. E cada história é não só um novo desenvolvimento na vida dos seus habitantes, mas também uma reflexão sobre a mudança e o progresso. Leva-nos a viajar e faz-nos refletir, em suma. E isso, associado à sua beleza transbordante, é mais do que suficiente para tornar este livro inesquecível. Muito à semelhança dos anteriores, aliás.

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