Viúva há relativamente pouco tempo, Filomena não sabe muito bem o que fazer com a sua vida nem como se reconstruir. Por isso, volta-se para o passado, para a história da mãe, tal como a recorda e imagina. Brígida partiu jovem para África, apaixonada e com uma grande história de amor no pensamento. Mas o caminho viria a ser tudo menos fácil e o amor menos fiel e duradouro que imaginava. E será essa a história que a filha tentará reconstituir, procurando um lampejo de verdade onde se encontrar.
Parte do que esta história tem de mais belo é a forma como, numa história de vidas imperfeitas em tempos conturbados, onde não há espaço para trajetos de contos de fadas, há sempre uma capacidade intrínseca de realçar o mais marcante de cada personagem. Mesmo no caso daquelas que são mais fáceis de odiar do que de entender, há sempre um lado vulnerável que as aproxima e que realça uma existência para lá do julgamento inicial. E, por outro lado, as que mais empatia desperta, têm também as sua ambiguidades e imperfeições, o que só as humaniza.
Outra das grandes forças deste livro é, naturalmente, a sua voz singular e a forma como equilibra um registo intimista, nostálgico, poético, até, de vez em quando, com comentos de grande intensidade dramática e outros de surpreendente leveza. Tal como a vida real, também este romance é feito de grandes revelações e pequenos passos, de exteriorização e introspeção, de gritos e de silêncios.
Finalmente, importa ainda salientar a estrutura e a forma como oscila entre diferentes perspetivas e períodos temporais sem nunca perder a fluidez e a envolvência. Na verdade, sendo também um romance sobre memórias, estas deslocações no tempo fazem especial sentido, além de realçar as ligações e semelhanças entre as personagens.
Maravilhosamente escrito e com um enredo sempre cativante, complexo, como as pessoas, mas cheio de intensidade, trata-se, em suma, de um livro memorável em todas as suas facetas. E marcante, como as gentes que nele habitam.
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