terça-feira, 28 de agosto de 2012

O Último Lobisomem (Glen Duncan)

Depois de duzentos anos de existência, Jacob Marlowe está cansado da sua existência. A vida tornou-se-lhe indiferente e essa apatia torna-se ainda mais evidente no momento em que lhe é comunicado que, após a morte do berlinense, ele é agora o último dos lobisomens. Já com pouca vontade de continuar, Jake faz um último esforço para deixar as suas questões resolvidas antes da lua cheia seguinte, altura em que um caçador movido pelo desejo de vingança deverá obter finalmente o que tanto deseja: a sua morte. Mas, enquanto Jake se prepara para aceitar, impávido, o confronto com o caçador, outras forças se movem e essas parecem ter um estranho interesse em que Jake se mantenha vivo. A lua cheia aproxima-se e, com ela, um percurso de revelações...
Construído num registo muito diferente do dos outros livros do autor, O Último Lobisomem apresenta, ainda assim, todos os pontos positivos do trabalho de Glen Duncan. E explora-os da melhor forma. O cenário dificilmente podia ser mais negro, com a violência e a crueldade como elementos inevitáveis para o contexto apresentado, e, ainda assim, há muito mais na história para lá da perseguição e da luta pela sobrevivência. E é aqui que entra uma das melhores características da escrita deste autor: a capacidade de construir momentos de introspecção e de reflexão sobre o mundo sem quebrar o ritmo compulsivo da narrativa. Jake Marlowe analisa constantemente o seu percurso e a sua natureza, e fá-lo com uma profundidade inesperada, mas sem perder de vista a tensão inerente à sua situação. Jake é perseguido, afinal, e tem de lidar com isso. As suas circunstâncias servem de base a um equilíbrio praticamente perfeito entre o lado de acção compulsiva do enredo e o lado mais introspectivo que se manifesta nas considerações sobre a personagem, as espécies e o mundo em geral.
Jake é um lobisomem e, tendo isto como ponto de partida, há, evidentemente, uma série de aspectos a desenvolver a nível de construção do cenário em que decorre a acção. Também aqui há muito de interessante. A informação é apresentada de forma gradual (e ainda incompleta, já que este é o primeiro volume de uma série), o que permite surpreender o leitor à medida que novas revelações são apresentadas e, ao mesmo tempo, assimilar aos poucos um sistema em que, ainda que os lobisomens sejam o centro do enredo, os outros seres sobrenaturais têm também uma função a desempenhar.
Há muito de interessante no contexto criado para esta história, portanto, e também a forma como a acção evolui, com todas as surpresas e mudanças associadas ao percurso de fuga e confronto que parece inevitável para o protagonista, contribui para o impacto global deste livro. Mas o mais importante, o que mais complexidade confere à narrativa, está nas personagens, e particularmente em Jake. Se muitas das figuras que cruzam o seu caminho parecem, em certa medida, secundárias - até porque a narração é feita, na maioria, do ponto de vista de Jake - a verdade é que quase todas as que têm com ele algum contacto mais pessoal, mesmo se breve, influenciam o rumo dos seus passos. E é este contacto, esta percepção de que todas as experiências deixaram marcas e sentimentos (mesmo que indesejáveis) que faz de Jake uma personagem capaz de evocar empatia, mesmo num cenário sombrio e cruel em que o próprio herói é um monstro.
Falta ainda referir uma das mais interessantes características da escrita de Glen Duncan e uma que, neste livro, se adequa na perfeição à personalidade do seu protagonista. Trata-se um sentido de ironia, com laivos de humor negro, que, associado a uma série de referências literárias particularmente certeiras, molda o tom da narrativa, consoante as circunstâncias, numa reflexão perfeita dos sentimentos e das ambivalências na mente do protagonista.
Acção e introspecção nas medidas certas, com o toque de emoção que torna humano um protagonista que, pela sua natureza, pouco o deveria ser, fazem de O Último Lobisomem uma leitura viciante, tanto pelo ritmo de acção e pelas sucessivas surpresas ao longo do enredo como pela complexidade e pelo fascínio que exercem as suas personagens. Fantástico.

2 comentários:

  1. Bem, estou a ver que adoraste este livro! Tenho-o cá em casa há algum tempinho e com as boas críticas que têm saído, estou a ver que tenho mesmo que ler!

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  2. Estou com bastante curiosidade de ler este livro. Ainda para mais com todas as optimas opiniões que tenho visto. Sem duvida um dos proximos a adquirir. Parabens pela opinião.

    Teresa
    http://romances-de-mesinha-de-cabeceira.blogspot.pt/

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