Mariana e Alice partilham a mesma casa. E, apesar de dificilmente poderem ser mais diferentes, une-as uma amizade sólida e capaz de sobreviver até à mais tensa das discussões. Mariana é uma galerista de sucesso e vive a vida da forma mais recta e responsável que consegue imaginar. Alice, por seu lado, tem um espírito indomável e a única coisa que a assusta são os compromissos. Mas o modo de vida de ambas está prestes a ser abalado. Tudo começa com uma série de bilhetes anónimos do que parece ser um admirador obcecado por Mariana. Mas as coisas revelam-se bem mais sérias a partir do dia em que Alice desaparece misteriosamente. É óbvio que as coisas estão relacionadas e, se Mariana quer a amiga de volta, precisa da ajuda de quem sabe. O que não espera é que o seu único aliado - um inspector tão soturno e altivo como ela própria - lhe mexa tão profundamente com as emoções.
Parte policial, parte romance, este é um livro que tem como grande ponto forte o equilíbrio entre o mistério e a emoção. O mistério, de múltiplas formas: os bilhetes misteriosos, os crimes do passado, o que fez do Escultor aquilo que é. E a emoção nos altos e baixos da amizade, depois no medo e nas reacções face ao perigo e ainda no romance que começa a despontar. E é curioso que estas duas partes se complementam lindamente, criando momentos de grande tensão, mas também de uma leveza refrescante. Tudo nos momentos certos.
Outro grande ponto forte diz respeito às personagens que, por vezes contraditórias, conseguem despertar emoções bastante fortes. Curiosamente é o vilão que se destaca, pois a construção daquilo que o move - e do que faz, convém não esquecer essa parte - é algo de muito perturbador. Mas também Mariana, Alice, André e mais uma ou outra figura secundária pelo caminho têm as suas qualidades. E, principalmente, defeitos, pois se há algo que desde muito cedo se torna óbvio é que não há personagens perfeitas neste livro: são humanas e isso significa que podem ser fortes, mas que também têm as suas vulnerabilidades.
Perde-se talvez um bocadinho do impacto, em termos de mistério, pelo facto de ser bastante fácil adivinhar a identidade do Escultor - até porque há um acontecimento importante que aponta muito claramente para a resposta. Ainda assim, e apesar de essa parte ser um bocadinho previsível, não deixa de ser interessante ver de que forma evoluem os acontecimentos, seja pelas dúvidas que continuam na cabeça dos protagonistas, seja porque, mesmo conhecida a identidade, continua a ser preciso lidar com a situação. E assim, perde-se um pouco do mistério, mas não se perde nada da intensidade. E depois há o fim, que, ao estender-se para lá da resolução do mistério, deixa antever um pouco do que vem depois da experiência difícil dos protagonistas, acrescentando um laivo de esperança a um percurso com vários momentos sombrios.
Tudo somado, fica a imagem de um livro intenso e envolvente, com várias personagens fortes e um enredo que, mesmo nem sempre surpreendendo, nunca deixa de cativar. Uma boa história, portanto, e uma boa leitura.
Título: O Escultor
Autora: Carina Rosa
Origem: Recebido para crítica
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