No preciso momento em que se prepara para beijar a rapariga mais bonita da sua escola, Rafael é atingido por um relâmpago e fica cego. E, embora não haja explicações concretas, essa cegueira permanece, tal como o amor que sente por Clarrise. Clarisse, a rapariga que ia beijar, assume uma presença fulcral na sua vida - sempre presente, sempre afectuosa, sempre compreensiva. E a relação de ambos prospera, apesar de todas as dificuldades. Até ao dia em que Rafael descobre que ela não é quem diz ser. Então, uma ideia surge na sua mente: a verdadeira Clarisse foi levada pelo relâmpago. E ele tem de a encontrar, senão na próxima tempestade, então na seguinte... ou na seguinte.
Oscilando entre três personagens distintas e diferentes momentos da linha temporal, este é um livro em que o primeiro aspecto a cativar é o delicado equilíbrio de estranheza e mistério que parece envolver toda a narrativa. No cerne, está o relâmpago que atingiu Rafael e depois todas as tempestades que se seguirão. Mas, ao traçar a história a partir de três pontos distintos, cria-se a sensação de caminhar para uma convergência, que, quando alcançada, trará todas as respostas necessárias... e algumas surpresas também.
Basta esta sensação de expectativa para prender o leitor. Mas há também outros aspectos. É uma história que parece assente no mundo real, mas em que teorias, sinais e inexplicáveis têm também um papel preponderante. E, assim, é como se surgisse um mundo novo a partir das raízes da realidade. Rafael vive no mundo real, mas o seu mundo é diferente. Perpétua conhece bem a realidade, mas está presa ao mundo de Rafael. E Virgílio... bem, Virgílio descobre novas possibilidades ao cruzar-se com o misterioso e (aparentemente) silencioso Tobias.
É de Virgílio, aliás, que surge a que será, talvez, a única ponta solta deste livro - uma ponta solta que faz sentido, pois a história gira essencialmente em torno de um outro protagonista. Ainda assim, a história pessoal desta personagem tem também muito de notável, deixando por isso a sensação de que também o seu percurso poderia ter sido mais aprofundado.
Mas, claro, a linha essencial é outra. E esta surge com um equilíbrio bastante impressionante: a forma como as três linhas convergem para um final marcante e intenso, associada à escrita que evoca na perfeição a melancolia, o desespero e a escuridão que assola a mente das personagens, torna a leitura num caminho mágico e fascinante, rumo a um término que nunca pode ser perfeito - pois também as personagens o não são - mas, ainda assim, muitíssimo adequado.
Qualquer destas três personagens bastaria para dar origem a uma história, mas as três juntas dão forma a um todo maior. E é esse todo enigmático, delicado e inexplicável que faz desta história intrigante e surpreendente uma tão boa leitura.
Autor: Yves Robert
Origem: Recebido para crítica
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