Uma mulher decidida a obter vingança de um dos homens mais poderosos e temidos da região, nem que isso lhe custe a vida e a de todos os seus aliados. Um homem destruído por uma falsa acusação, que se vê novamente arrastado para o mundo do crime, seduzido por uma mulher que não é o que parece. E um mundo onde a única justiça é a da força, do medo e das armas, pois nem os sonhos, nem a esperança, e muito menos as ilusões podem sobreviver aos ditames da lei do mais forte.
Há algo de absurdamente fascinante na forma como os livros desta série conseguem ser, ao mesmo tempo, histórias de crime e castigo e visões de um mundo onde conceitos tão aparentemente evidentes como a moral e a justiça ganham um sentido completamente diferente do que consideramos normal. É um mundo à parte, onde as regras são distintas - ou não existem de todo - e onde até as personagens que mais inocentes parecem em toda a vastidão do cenário acabam por sofrer as consequências do mundo que lhes tocou em sorte. Talvez seja por isso que também os sentimentos que desperta são complexos: não é um caso de simples empatia por vilões, porque num mundo como este ninguém pode ser um verdadeiro herói. É mais a percepção de um conjunto de circunstâncias em que ser bom é estar morto e, por isso, as marcas e as escolhas conduzem sempre à escuridão.
É um mundo moralmente ambíguo e em que a desolação reina soberana. E, assim sendo, só pode ser sombrio. Por isso, sobressaem inevitavelmente os elementos mais negros, não só na construção das histórias e das personagens, com os fios de poder e de violência a conspurcar tudo aquilo que tocam, mas também no reflexo visual destes mesmos meandros. São histórias de crimes consumados aparentemente nas sombras, pelo que os tons sombrios fazem todos os sentidos. São histórias de dor, física e mental, e esta reflecte-se com toda a precisão nas expressões das personagens. E são histórias de morte e sangue, com rasgos de sensualidade, pelo que também os rasgos vermelhos, quais fluxos de movimento a cortar os momentos mais estáticos, fazem especial sentido.
Mas importa olhar ainda uma vez mais para a história, para destacar, além da sombria desolação que parece pairar sobre tudo, a empolgante sucessão de surpresas que vai sulcando o caminho. Não é só uma questão de finais inesperados, é que ninguém neste livro é o que parece. Os realmente inocentes foram transformados. Outros, embora parecendo, nunca o foram realmente. E até aqueles cujo lado mais negro é o que mais facilmente se identifica escondem, por vezes, profundidades insuspeitas, seja nos laços criados, seja no estranho código de honra que, nos momentos de viragem, acaba por se manifestar.
Crime e desolação em paisagens sombrias, num mundo tão vasto quanto moralmente ambíguo e repleto de personagens que, embora aparentemente presas aos meandros da teia em que se movem, têm sempre algo de novo para revelar. Intenso, dramático e cheio de surpresas, um livro que facilmente se entranha na memória. Como, aliás, já era de esperar, sendo de quem é.
Título: Criminal - Livro Dois
Autores: Ed Brubaker e Sean Phillips
Origem: Recebido para crítica
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