Há quem ache que Huck, o rapaz que trabalha na bomba de gasolina, é um pouco lento, mas nada podia estar mais longe da verdade. Huck tem o poder especial de conseguir encontrar seja o que - ou quem - for e usa o seu dom para, tal como lhe ensinaram, fazer uma boa acção por dia. Este dom é o segredo mais bem guardado da zona... mas eis que uma recém-chegada decide vender a história à televisão. A tranquilidade discreta de Huck salta para todos os ecrãs. E há olhos menos benévolos à espreita... os mesmos que conhecem o segredo das suas origens.
Parte do que mais surpreende nesta comovente história, mais até do que os vários desenvolvimentos inesperados do enredo, é a forma como concilia com precisão traços aparentemente irreconciliáveis. É uma história de ternura - de um rapaz abandonado que retribui com boas acções o amor da comunidade que o acolheu - e também de acção e mistério, com experiências secretas, um cientista louco e uma perseguição que se prolonga por anos. É uma história inocente - como o próprio protagonista, aliás - e, ao mesmo tempo, cruel na forma como despedaça às esperanças deste tão simpático protagonista. E é, por isso, uma história de contrastes, que tanto vicia como enternece, mas nunca deixa de cativar.
E também particularmente interessante a forma como este contraste se manifesta a nível visual, com cenas alucinantes, em que os movimentos de Huck quase parecem transbordar da página, a contrastar com os sorrisos e lágrimas inocentes dos pontos de introspecção. Huck tem o seu quê de super-herói, pelo que fazem todo o sentido a abundância de cor, as sequências de acção e até mesmo os rasgos de escuridão que atravessam o seu caminho. Mas é também uma daquelas almas genuinamente bondosas e há algo de comovente nas suas expressões - sobretudo nos sorrisos.
Importa ainda regressar à história para destacar dois ou três aspectos - aparentemente secundários. Primeiro, a relação de Huck com a comunidade, que parece passar para segundo plano com o desvendar das suas origens, mas nunca deixa de ser profunda e genuína. Depois, a questão da estranha que revelou o segredo, que encontra nas últimas páginas uma resolução tão surpreendente - e, ainda assim, tão ajustada à personagem - que é impossível não sorrir ao vê-la. E, finalmente, o pequeno Ethan, figura muito discreta, mas que permite uma revelação perfeita da origem do outro dom de Huck - o bom coração.
Ternura, inocência e bondade contrastam, pois, nesta história com um conjunto de maquinações sombrias e revelações perigosas. E, de entre os grandes rasgos de acção e os pequenos - mas tão brilhantes - momentos de emoção, surge uma história que é, no essencial, muito simples, mas também tão marcante como o grande coração do seu protagonista. Vale muito a pena conhecer Huck e a sua história.
Título: Huck
Autores: Mark Millar, Rafael Albuquerque e Dave McGaig
Origem: Recebido para crítica
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