Um acontecimento capaz de traçar o limite da despreocupação e despertar em pleno a vida adulta, uma mudança que inicia buscas e transformações. Uma gravidez indesejada de uma estudante decidida a abortar em tempos de clandestinidade e que recorda, ao fim de muito tempo, os passos orientadores deste acontecimento. Vida narrada em voz de romance, mas num registo intimamente pessoal.
Apesar da evidente brevidade deste livro, não se trata propriamente de uma leitura fácil de descrever. Sempre a deambular pela fronteira da realidade, mas com a visão por vezes ambígua da memória, não é tanto uma história como a introspeção, embora girando em torno de um acontecimento. E é também uma história que podia ser de muitas, o que deixa também uma marca singular.
Também devido à brevidade, mas no próprio registo, há uma impressão de concisão nos factos que contrasta com a vastidão da matéria para reflexão. O próprio tema suscita questões e a forma pessoal, mas refletindo uma situação comum a muitas outras, evoca questões sociais e até sobre a natureza humana.
E, mais uma vez, tudo de forma muito sucinta, o que faz sobressair um outro ponto. A narrativa converge para um acontecimento e o ritmo das palavras reflete essa convergência, oscilando entre deambulares pelas palavras, explicações muito rápidas e momentos de pura intensidade dramática.
Tudo somado, o que fica é a sensação de um livro pequeno, mas vasto, pessoal, mas aberto às questões e complexidades sociais, e com uma voz certeira e direta, mas que evoca na perfeição os meandros da memória. Conciso, mas com uma eficácia memorável, um livro que marca de diferentes formas.
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