Uruk, cidade de Inanna. Uma jovem noviça é escolhida para, durante um ano, se tornar Nin, a que fala com a deusa. Mas o que devia ser apenas uma posição cerimonial não chega para Kulita, que, inteligente e ambiciosa, vê como os sacerdotes que comandam a cidade se aproveitam da fragilidade do Ensi para se apoderarem do que a Inanna pertence. E, à medida que vai conquistando um lugar no coração do Ensi, Kulita começa a fazer perguntas desconfortáveis, a investigar comportamentos e falhas, a assumir um lugar de destaque que a muitos desagrada. Há quem queira livrar-se dela e regressar aos hábitos de sempre. Mas Kulita pode ser tudo menos fraca. E, com a voz de Inanna do seu lado, tudo é possível.
Parte do que torna esta leitura tão empolgante é a capacidade do autor de mergulhar num passado longínquo, com tradições, crenças e hábitos distintos e torná-lo tangível, não só através das movimentações das personagens, mas através dos evidentes paralelismos com outros períodos históricos. Não importa que tudo decorra num período antes da escrita - sendo esta, aliás, um dos desenvolvimentos mais notáveis a ocorrer ao longo desta narrativa. A actuação pouco correcta dos sacerdotes, o desprezo com que qualquer novidade é encarada, a aversão à entrada em cena de um grupo de estrangeiros e, claro, à posição de poder de uma mulher como Kulita despertam questões tão poderosas na antiga Mesopotâmia como nos tempos de hoje. E esta sensação de intemporalidade, associada à força de uma escrita envolvente e de um enredo pejado de personagens notáveis, torna a leitura bastante irresistível.
Também a construção das personagens é particularmente memorável, principalmente no que respeita a Kulita e a Zamug. Ambos são, à sua maneira, personagens fortes, Kulita com a sua curiosidade insaciável e a ambição de fazer tudo pela sua cidade, Zamug com a sua dedicação incansável à descoberta da escrita. E ambos têm também as suas fraquezas e vulnerabilidades, Kulita na forma como a sua ambição a leva, por vezes, a comportamentos ambíguos e a esquecer ligações que lhe parecem secundárias, Zamug no desânimo e no desapego a que, por vezes, a sua missão o conduz. São personagens cativantes, mas falíveis, o que só as humaniza, reforçando também o impacto dos momentos mais dramáticos.
E importa, claro, referir o final, que, embora não seja totalmente imprevisível, tendo em conta certas revelações do início, consegue, ainda assim, surpreender pela intensidade que é dada a uma conclusão relativamente conhecida. Sim, é possível antever de que forma tudo terminará para os protagonistas, mas os passos exactos e a intensidade dos momentos têm, ainda assim, um impacto surpreendente. Além, claro, de estranhamente adequado, tendo em conta a forma como as coisas foram conduzidas.
Intenso no enredo, forte na construção das personagens e muito cativante na escrita, trata-se, pois, de um livro que facilmente nos transporta para o passado, questionando ao mesmo tempo apegos e visões que prevalecem ainda no presente. É uma história de ascensão e queda, de um ciclo, talvez, de glória e de ruína. Mas é, acima de tudo, a história de uma mulher brilhante e ambiciosa - e que história memorável!
Parte do que torna esta leitura tão empolgante é a capacidade do autor de mergulhar num passado longínquo, com tradições, crenças e hábitos distintos e torná-lo tangível, não só através das movimentações das personagens, mas através dos evidentes paralelismos com outros períodos históricos. Não importa que tudo decorra num período antes da escrita - sendo esta, aliás, um dos desenvolvimentos mais notáveis a ocorrer ao longo desta narrativa. A actuação pouco correcta dos sacerdotes, o desprezo com que qualquer novidade é encarada, a aversão à entrada em cena de um grupo de estrangeiros e, claro, à posição de poder de uma mulher como Kulita despertam questões tão poderosas na antiga Mesopotâmia como nos tempos de hoje. E esta sensação de intemporalidade, associada à força de uma escrita envolvente e de um enredo pejado de personagens notáveis, torna a leitura bastante irresistível.
Também a construção das personagens é particularmente memorável, principalmente no que respeita a Kulita e a Zamug. Ambos são, à sua maneira, personagens fortes, Kulita com a sua curiosidade insaciável e a ambição de fazer tudo pela sua cidade, Zamug com a sua dedicação incansável à descoberta da escrita. E ambos têm também as suas fraquezas e vulnerabilidades, Kulita na forma como a sua ambição a leva, por vezes, a comportamentos ambíguos e a esquecer ligações que lhe parecem secundárias, Zamug no desânimo e no desapego a que, por vezes, a sua missão o conduz. São personagens cativantes, mas falíveis, o que só as humaniza, reforçando também o impacto dos momentos mais dramáticos.
E importa, claro, referir o final, que, embora não seja totalmente imprevisível, tendo em conta certas revelações do início, consegue, ainda assim, surpreender pela intensidade que é dada a uma conclusão relativamente conhecida. Sim, é possível antever de que forma tudo terminará para os protagonistas, mas os passos exactos e a intensidade dos momentos têm, ainda assim, um impacto surpreendente. Além, claro, de estranhamente adequado, tendo em conta a forma como as coisas foram conduzidas.
Intenso no enredo, forte na construção das personagens e muito cativante na escrita, trata-se, pois, de um livro que facilmente nos transporta para o passado, questionando ao mesmo tempo apegos e visões que prevalecem ainda no presente. É uma história de ascensão e queda, de um ciclo, talvez, de glória e de ruína. Mas é, acima de tudo, a história de uma mulher brilhante e ambiciosa - e que história memorável!
Título: Senhora do Amor e da Guerra
Autor: Sebastião Alves
Origem: Recebido para crítica
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