quinta-feira, 24 de setembro de 2020

O Heterónimo de Pedra (Henrique Castanheira)

Vidas que se prolongam em diferentes formas. Viagens por espaços de múltiplos países, tão reais como as histórias que aa imaginação lhes traça. Elementos de lenda, de mito, de superstição e de realidade. E algo de comum a todos, mas que os separa também: a persistência da morte por entre os meandros da vida. São estas as linhas essenciais deste pequeno livro de também pequenos contos. Contos que, nas suas estranhas deambulações, têm tanto de intrigante como de impossível de descrever.
Provavelmente o aspecto que mais se destaca neste livro é o contraste entre a brevidade, tanto do todo como de cada um dos contos, e a complexidade que os parece impregnar. Podem partir de um início simples, mas rapidamente se tornam labirínticos, seja com a entrada em cena de uma figura inesperada, com os meandros dos cenários visitados ou até com os laivos de lenda ou fantasia que discretamente vão surgindo. O resultado é uma leitura que, apesar de breve, exige tempo e atenção, pois são muitos os pormenores a assimilar.
Outro efeito deste contraste é uma relativa ambiguidade, que faz com que nunca seja absolutamente claro se o que é descrito é narrado é real ou fruto da imaginação das personagens, se é que as próprias personagens são elas mesmas reais. E, se é certo que isto pode, por vezes, parecer algo confuso, contribuindo também para tornar mais pausada a cadência das palavras, também o é que esta peculiaridade acrescenta como que uma surpresa constante, pois nada é certo nestes contos, excepto que tudo será inesperado.
São contos essencialmente independentes, ainda que todos pareçam seguir a mesma linha do improvável. São também relativamente independentes das ilustrações que os acompanham. Ainda assim, é interessante notar que o conjunto parece fazer sentido. As palavras mantêm essencialmente a mesma voz peculiar e o estilo também singular das ilustrações confere coesão ao todo. Assim, cada conto pode ser lido de forma isolado, mas o conjunto passa a impressão de um todo maior.
Difícil de descrever, mas fascinante na sua estranheza, trata-se, em suma, de um conjunto peculiar, onde realidade e imaginação se confundem e onde as impressões que ficam podem ser relativamente fragmentárias... não deixando, ainda assim, de exercer um estranho fascínio.

Autor: Henrique Castanheira
Origem: Recebido para crítica 

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