Entregar o coração a alguém pode ser uma das coisas mais assustadoras da vida, principalmente para quem já o fez algumas vezes e... correu mal. Mas há formas de mudar o caminho previsível, olhando um bocadinho mais para nós antes de mergulharmos de cabeça, aprendendo a dar e a receber com conta, peso e medida, a persistir - e a desistir quando a situação é um caso perdido - e a abrir novamente as asas depois de uma grande queda. É sobre todas estas coisas e sobre as relações - com os outros e com a nossa própria consciência - que este livro fala.
Uma das primeiras coisas a chamar a atenção para este livro é o impacto visual. Sendo escrito em forma poética, embora num registo muito simples, cedo se torna evidente que os desenhos simples das páginas vêm reforçar a impressão de proximidade emocional que vem das palavras. Não é nem pretende ser um diário, mas esta conjugação de texto e imagem dão-lhe, até certo ponto, um aspecto de um, o que contribui para a impressão de uma leitura intimista, algures entre o conselho e a confidência sobre os assuntos do coração.
Outro aspecto a salientar é que não se destina necessariamente a ser lido de forma sequencial. Pode fazer-se, é certo, e isso não retira nenhuma da relevância às ideias, ainda que uma leitura consecutiva possa deixar, por vezes, a sensação de uma ligeira repetição. Mas, lido da forma como a autora sugere, abrindo-o ao acaso e lendo as mensagens, pode funcionar como um pequeno conselheiro, como uma presença que desafia e - até certo ponto - orienta. Como um guia silencioso, mas muito eloquente, para as relações com os outros e connosco.
E é um livro muito próximo, pois a simplicidade das palavras, associada ao simples facto de terem como tema as relações, confere uma estranha afectuosidade. Funciona quase como a voz de uma amiga que ouve os desabafos e depois aconselha. Claro que cada um tem a sua história e o que é válido para alguns não o será para outros. Mas há coisas que são tão simples e que parecem tão evidentes que acabam por surgir como uma surpresa, ao estilo "como é que eu nunca pensei nisso?"
Visualmente encantador e com um registo que equilibra de forma eficaz a simplicidade das palavras e a precisão dos conselhos, trata-se, pois, de um livro que, mais do que de leitura única, apela a múltiplos regressos. Afinal, as grandes verdades escondem-se, por vezes, nas pequenas coisas. E material para reflexão é algo que não falta ao longo destas páginas...
Título: Voar Depois de Cair
Autora: Isabel Baía Marques
Origem: Recebido para crítica