segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Talvez Devesses Falar com Alguém (Lori Gottlieb)

Terapia. Haverá quem pense que não passa de um desabafo glorificado, ou de algo que não serve para muito mais do que procurar conselhos. Outros vê-la-ão como um remédio rápido, uma procura de respostas imediatas para os problemas da vida. E outros haverá ainda que nem querem ouvir falar em tal coisa. Mas como é? Como funciona? E mais, quem é a pessoa do outro lado? Este é um livro sobre terapia que não é só sobre terapia. É a história de uma terapeuta, das suas pessoas mais próximas, dos seus pacientes... e, sim, do seu terapeuta também. E há algo de fascinante em como tudo isto se entrelaça.
Algo que importa referir acerca deste livro é que, apesar de ser longo, e de merecer ser apreciado com calma, não é um livro pesado nem dramático. Há uma leveza na forma como a autora escreve que dá vida a cada episódio e a cada reflexão, sem lhe retirar intensidade ou impacto - e, sim, há momentos de justificado dramatismo - mas com uma serenidade que transborda. E assim, é um livro que se lê com fluidez, mas que merece ser lido com atenção plena. Até porque não faltam frases memoráveis, daquelas que se entranham no pensamento, a surgir quando menos se espera.
É também, inevitavelmente, um livro com muito material para reflexão. A própria natureza do tema exige que assim seja. Mas também neste aspeto a voz da autora faz com que tudo flua com naturalidade. Seremos levados à introspeção, mas sempre de forma simples, sem análises demasiado complexas ou rebuscadas, mas olhando para a vida - para as deste livro e para a nossa - e tirando daí as necessárias conclusões. É quase como se o livro falasse ao pensamento, como se as ideias se tornassem parte de nós. Como se fossem, à sua maneira, também uma espécie de terapia.
Ainda um último ponto a destacar vem, naturalmente, das histórias. Não é um livro de ficção, mas tem momentos em que se lê como se fosse, porque as histórias destas pessoas têm a envolvência de um romance. E saber que são reais aumenta a intensidade, a proximidade e a força. É quase como se tornassem conhecidas. E é curioso como, tendo em conta que, para a maioria destas pessoas, a história não acaba no que é contado neste livro, a forma que estas histórias assumem no livro permite uma conclusão satisfatória.
Lê-se com leveza, mas persiste. Não é um guia nem um livro de autoajuda, mas não deixa de esconder pérolas de sabedoria no seu interior. E é uma história pessoal, mas que nos reflete, e que por isso se entranha, cativa e apela à reflexão. É longo e merece ser lido com calma. E, acima de tudo, merece muito ser lido.

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