Afectos, amores, amizades, paixões, sofrimentos. De tudo isto e mais se faz a vida. E é também da soma de tudo isto que surge este conjunto de poemas que, sem estrutura definida, mas com um esquema de rima bem presente, percorrem pensamentos, vivências e relações únicas e pessoais, dando voz a uma vida em múltiplas facetas e em que a perfeição não surge tanto como um alvo, mas como um fim a evitar. Uma vida que, pessoal e intransmissível, tem, ainda assim, tanto de único como de familiar.
Escrito em verso, mas num ritmo que, não fosse a rima, facilmente se poderia transpor para um texto em prosa, este é um livro em que as ideias dominam sobre a estrutura. Ora, isto é interessante, porque, havendo uma forma bastante livre, mas apesar disso com rima, cria-se um contraste peculiar: por um lado, as ideias fluem com mais liberdade; por outro, a rima parece impor a alguns dos versos uma formulação algo forçada. E assim, há poemas que fluem com uma incrível naturalidade, enquanto que noutros é a estranheza a sobressair.
Um outro aspecto desperta sentimentos ambíguos. Se é verdade que o cerne desta poesia é pessoal, havendo por isso, acima de tudo, uma expressão de sentimentos próprios, há em boa parte dos poemas raízes comuns com que qualquer leitor se pode identificar. Na segunda parte, porém, surgem nomes, pessoas específicas, relações familiares que pertencem exclusivamente à autora. Ora, isto cria distância, pois, sendo estes afectos exclusivamente pessoais, há todo um conjunto de vivências e relações que os justificam. E esses, o leitor comum jamais os conhecerá.
Fica, por isso, essencialmente, o contraste entre dois factores: por um lado, a universalidade dos sentimentos (ainda que vividos de forma única e pessoal), por outro, a história pessoal de quem escreve os versos, história essa que motiva as homenagens e referências particulares que vão surgindo. E, deste contraste, surgem também dois tipos de reacções: nalguns casos, a sensação de familiaridade para com uma emoção comum, noutros, a estranheza de um conjunto de referências e relações que passam ao lado de quem não conhecer as pessoas referidas.
E, assim, a impressão que fica é a de uma leitura interessante, com alguns textos bastante impressionantes e uma sensação de coesão bastante forte, mas em que, por vezes, o registo se torna demasiado pessoal. Compensa, ainda assim, a fluidez das palavras e a muito agradável surpresa de encontrar, em alguns poemas, uma sensação de proximidade capaz de compensar toda a distância dos outros.
Título: Dor da Perfeição
Autora: Rita Tavares
Origem: Recebido para crítica
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