quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Encontrar-me, Encontrar-te, Encontrá-lo (Maria Cunha e Silva)

A perda da mãe e o peso das responsabilidades levaram Júlia a abandonar quaisquer expectativas e a viver a sua vida de acordo com o que dela era esperado. Mas o tempo passou, a dor só se tornou mais pesada e a única âncora que manteve - o namorado - parece-lhe agora mais uma limitação. Para amar o mundo, precisa de se amar a si mesma, e não o está a fazer. É, pois, por impulso e necessidade de se encontrar que Júlia compra um bilhete para a Tailândia, na esperança de que, durante as suas viagens, encontre a sua verdadeira identidade. O que nem sequer imagina é que vai encontrar muito mais além disso...
Provavelmente o grande ponto forte deste livro é a sua capacidade introspectiva e a forma como, alongando-se nos pensamentos, dúvidas, paixões, certezas, valores e mudanças da protagonista, a autora consegue evocar bocadinhos da vida de qualquer um de nós. Todos conhecemos perdas, (des)ilusões, esperanças que falharam, abismos aparentemente infinitos e bases de superação improváveis. E, assim, ainda que nem sempre seja fácil compreender estas personagens, existem sempre pontos de proximidade, frases que falam à nossa própria identidade e nos fazem querer saber mais sobre este grupo de pessoas.
A maior surpresa vem também deste percurso, já que as escolhas das personagens são muitas vezes moralmente ambíguas, o que significa que ninguém é absolutamente admirável nem um absoluto vilão. Bem... quase ninguém. Ora, isto tem dois impactos: o primeiro é a percepção das imperfeições humanas, pois escolhas erradas acontecem a todos e as perspectivas mudam consoante o conhecimento. O segundo é que nem tudo é justificável, daí que haja um ponto em que os tons de cinzento têm de dar lugar a uma percepção mais clara.
E é isto que me leva a outra ambiguidade: a sensação de que ficam nesta história algumas pontas soltas. O percurso de Jacob e a história familiar de Rafael passam para segundo plano face à história de amor dos protagonistas, o que deixa vários assuntos por resolver. E, sendo certo que assumem uma posição secundária, é impossível não ficar com uma certa curiosidade insatisfeita, num dos casos por falta de consequências, no outro pela grande revelação final.
Tendo tudo isto em conta, sobressaem dois pontos na impressão final: a força emotiva do que é, acima de tudo, uma história de amor e o crescimento da protagonista, que, ambiguidades à parte, chega ao fim do seu caminho como uma pessoa melhor e com uma voz própria muito mais firme. Juntemos a isto as várias frases memoráveis e os pontos de proximidade e o resultado é muito simples: uma história que não é perfeita, mas não deixa, ainda assim, de ser uma boa leitura.

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