A ideia de um carácter sagrado da pessoa humana, embora sujeita a discussões e a múltiplas perspetivas, é algo frequentemente evocado quando surgem discussões sobre direitos e liberdades, principalmente quando associadas a questões mais controversas. Este ensaio, porém, questiona a base da própria expressão: é a pessoa humana que é sagrada, ou o todo do ser humano? O pessoal ou o impessoal? A resposta não pode ser absoluta - mas a visão que este texto traça é não só um belo ponto de partida para discussões mais profundas, mas também uma poderosa reflexão sobre o que define a verdade, a beleza e a justiça.
Provavelmente um dos pontos mais impressionantes desta leitura é o fortíssimo contraste entre brevidade e complexidade. Não chega às cem páginas, mas contempla a natureza humana - e, sim, a sua sacralidade - com uma profundidade notável, debruçando-se tanto sobre as facetas da vida em sociedade como sobre o que de mais individual existe no ser humano. Além disso, questiona até convicções que podem parecer fundamentais, o que gera, naturalmente, sentimentos ambíguos, mas sobretudo o desconforto que leva a novas interrogações e a uma reflexão mais profunda.
Todo o texto gira em torno da questão da pessoa e do sagrado, e é também para a abordagem a estes dois conceitos que importa olhar. A visão de pessoa como parte, como algo para lá do qual existe algo mais, implica necessariamente algo de transcendente. E a ideia de sagrado... bem, não há como fugir a associações de fé. Mas o que sobressai neste aspeto é que este transcendente, este sobrenatural, tem um lado de contemplação do divino, mas não necessariamente associado a uma crença específica, mas sim a uma mais indefinível fé em algo superior. Não se cinge, pois, à perspetiva de uma única crença, expandindo-se para algo mais abrangente, ainda que também mais difícil de definir.
Sendo uma reflexão complexa, apesar da fluidez das palavras, é um texto que exigirá o seu tempo, apesar da relativa brevidade. E que deixará sentimentos ambíguos, pois desafia convicções arraigadas, partilhando outras com que nem sempre será fácil concordar. É, por isso, mais uma base de ponderação do que uma exposição de verdades. E não se esgota no final da leitura.
Breve mas profundo, complexo mas escrito com uma fluidez fascinante, trata-se, em suma, de um ensaio que opõe ao carácter sagrado da pessoa humana a sacralidade da humanidade no seu todo. E esta perspetiva tão diferente, mas tão bem construída na sua exposição, não deixa de servir de base para uma boa contemplação.
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