Julia soube que aquela casa lhe pertencia no primeiro dia em que a viu, tinha então cinco anos. Desde esse dia, como se o destino a empurrasse para aquele lugar, acabou por, quase involuntariamente, passar por ali mais duas vezes. Na última, comprou, finalmente, a casa e Greywethers tornou-se sua. Mas o destino tem mais para lhe mostrar que apenas uma casa onde se sentir bem. Julia acaba de se mudar para Greywethers e começa apenas a conhecer os habitantes da aldeia quando a mente lhe começa a pregar partidas. Quando menos espera, perde total consciência da realidade em que se encontra e vê-se transportada para o passado de outra mulher. De Mariana, uma jovem que, séculos antes, chegou a Greywethers, depois de perder a mãe, para encontrar um tio autoritário e violento... e, no solar Crofton, o amor da sua vida. A história de Mariana começa a confundir-se com a de Julia e, enquanto mergulha mais profundamente nas memórias desse passado que não é seu - ou que talvez lhe pertença de outra vida - , Julia julga, também, reconhecer no actual senhor do solar o apaixonado da vida de Mariana. Mas será o destino assim tão fácil de compreender?
Tal como em O Segredo de Sophia, a ideia de uma memória partilhada com alguém do passado é um dos elementos centrais desta narrativa. Em comum entre os dois livros, há também um romance, tanto no passado como no presente, mas com uma maior intensidade no passado. Ainda assim, o tempo de Mariana é um tempo diferente e o mesmo acontece com a sua história. O romance de Richard e Mariana é bastante mais simples, e desde cedo é fácil deduzir que o desfecho para que se encaminha é em tudo diferente. Ainda assim, os grandes pontos fortes são os mesmos: empatia para com as personagens e as suas circunstâncias; forças em conflito, na vida pessoal dos protagonistas e no contexto histórico em que se enquadram; e a ideia de uma ligação tão forte que perdura através do tempo.
Muitos dos acontecimentos mais marcantes acontecem, de facto, na história de Mariana, sendo ela a protagonista de vários dos momentos mais intensos e mais emotivos. Mas também Julia tem uma história cativante, quer na sua relação familiar e na ligação que tem a Geoff, mas também, e principalmente, na forma como lida com a descoberta do passado, partindo do receio da loucura e evoluindo, com cada descoberta, para uma atitude bem diferente. Este crescimento gradual, mais suave, contrasta com a intensidade das memórias, criando um ritmo fluído e envolvente para uma leitura em que a força do enredo e a beleza da escrita se harmonizam num equilíbrio quase perfeito.
Se é certo que até as questões mais complicadas fazem sentido no fim, também é verdade que nem tudo termina com o último capítulo. Há, no percurso de Julia, descobertas que a colocam perante novas escolhas e novos inícios, o mesmo acontecendo com aqueles que a rodeiam (mesmo os que têm um papel mais discreto na história). Isto leva a que o final, ou parte do final, tenha algo de ambíguo, deixando ao leitor a missão de imaginar o que acontece depois da história. Fica, assim, alguma curiosidade no ar, mas também a impressão de que, tendo em conta as revelações, essa acaba por ser a conclusão mais adequada.
História de destinos cruzados e de vidas reencontradas, este é um livro em que dois tempos se cruzam, num enredo que, equilibrado entre o desenvolvimento do contexto histórico e o percurso pessoal das personagens, cativa desde as primeiras páginas e emociona a cada novo momento marcante. Belo, comovente e com uma história fascinante, Mariana é um livro que fica na memória. E é tudo isto que o torna tão impressionante.
Sem comentários:
Enviar um comentário