Khadija bint Khowaylid encontra-se numa situação delicada. Por um lado, a sua riqueza continua a sustentar o seu poder. Por outro, o facto de ser mulher e viúva torna-a um alvo fácil para os seus inimigos. E aqueles que atacam nas sombras estão a ficar cada vez mais ousados. A solução mais óbvia passa pelo casamento - mas não com um homem qualquer. Khadija precisa de um esposo que respeite a sua voz, em vez de lhe exigir a submissão. E o homem que procura não podia estar mais perto. Muhammad é jovem, pobre e pertence a uma família sem grande influência. Mas o rapaz que Khadija conheceu como servo acaba de regressar como homem de força. E a união das forças de ambos pode muito bem ser o início de algo grandioso.
Primeiro volume de uma trilogia sobre as mulheres do Islão, este é um livro que, centrado mais na figura de Khadija do que na de Muhammad, se prende mais com história do que propriamente com as bases de uma futura religião. Aliás, durante grande parte do enredo, os deuses são outros e a sua influência sobre os homens ambígua. Mas é precisamente isto que torna a leitura interessante, pois os deuses podem estar presentes, mas são os humanos a essência da história.
Passando, pois, à história e aos acontecimentos, o primeiro ponto forte a destacar-se é, sem dúvida, a caracterização de Khadija. Mulher forte, capaz de defender o seu lugar, mas vulnerável à dúvida e ao orgulho, revela-se gradualmente como a grande personagem que é. E se, numa fase inicial, há uma certa impressão de distância (devida, em grande parte, ao predomínio da intriga sobre as facetas mais pessoais da vida da protagonista), a evolução dos acontecimentos revela outros aspectos. Aspectos que mostram personagens mais complexas, mais capazes de gerar empatia, mas sempre imperfeitas, o que as torna também mais reais.
Fica a sensação de que, ao centrar a história na figura de Khadija, o autor deixa outros aspectos por explorar. Principalmente na fase final, com as visitas de Muhammad à gruta e todas as mudanças que daí advêm, a perspectiva de Khadija acaba por impor algumas limitações, pois fica a sensação de que mais haveria a dizer sobre aquilo que é vivido por Muhammad. Mas a história é a de Khadija e, tendo isso em conta, não há nada de essencial que fique por dizer. Excepto é, claro, o que se seguirá, em tempos que serão já os de outras personagens.
De ritmo pausado, mas sempre envolvente, com personagens fortes e cativantes e uma perspectiva bastante ampla do tempo em que se movimentam, eis, portanto, um livro que facilmente cativa e que, sem dar todas as respostas, desperta muita curiosidade para o que virá a seguir. Interessante e surpreendente, uma boa leitura.
Título: Khadija - A Mulher de Maomé
Autor: Marek Halter
Origem: Recebido para crítica
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