domingo, 29 de agosto de 2021

Um por Um (Ruth Ware)

Neve, esqui e umas férias de luxo: é esse o plano para a equipa da Snoop, uma empresa em ascensão cuja aplicação parece estar a ter um sucesso sem precedentes. Só que há sombras a pairar sobre esse luxuoso retiro. Há uma oferta de aquisição em cima da mesa e os acionistas da Snoop estão muito obviamente divididos. Em vez da promessa de descanso, o que parece cada vez mais presente é a tensão entre os vários elementos do grupo. E as coisas ainda mal começaram a complicar-se. Primeiro, um dos fundadores desaparece. Depois, uma avalanche deixa-os isolados. E o que parecia ter sido um acidente começa agora a dar sinais de ser obra de um assassino... que parece estar a ceifá-los um a um.
Comparada, por vezes, a uma Agatha Christie dos tempos modernos, Ruth Ware demonstra neste livro a precisão dessa comparação, não só pela capacidade de construir mistérios intrincados onde todos são suspeitos, mas pelas pequenas referências que parecem emergir do enredo. Neste caso, a acumulação de mortes uma a uma tem evidentes ecos de As Dez Figuras Negras, ainda que numa forma totalmente nova, num cenário muito mais moderno e com uma identidade própria. Parece premeditado, na verdade, como que em jeito de homenagem. E torna tudo mais intrigante, pois há um mundo de diferenças salpicado por pequenas semelhanças.
Outro aspeto marcante vem da dualidade de perspetivas, pois a história é narrada pela voz de duas das personagens principais. Erin e Liz dificilmente poderiam ser mais diferentes, tendo em comum apenas o facto de terem uns quantos segredos. E, ainda assim, à medida que o enredo evolui, e que os aparentes laços vão dando lugar a suspeitas, possibilidades e reviravoltas, há diferenças que se vão esbatendo e outras que se vão revelando, acrescentando novas perspetivas a cada novo desvendar de suspeitas.
Claro que o grande mistério é a identidade do assassino, e também aqui a autora consegue surpreender... como em tudo o resto, aliás. Mas há muito mais em torno deste mistério, desde as relações pessoais e profissionais às tensões e estratagemas, sem esquecer, claro, as sombras persistentes do passado. Há uma grande teia em torno do curto período de tempo em que o enredo decorre. E, além da intensidade que resulta da conjugação de todos estes elementos, há um crescendo de intensidade que culmina num final que surpreende não só pelas grandes revelações, mas pelas decisões com que confronta as várias personagens depois de tudo desvendado.
Intenso e intrincado, cheio de surpresas e de segredos, e principalmente muito viciante, trata-se, pois, de um livro que nos transporta para o coração do mistério. Prende desde as primeiras páginas e não deixa de surpreender até ao fim. E é também isso que o torna tão empolgante e memorável. Muito bom, em suma.

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