1943. Denunciada como espia devido a uma paixão não correspondida, Elizabeth de Mornay vê-se obrigada a fugir a toda a pressa de Paris. Perseguida pela Gestapo e na inesperada companhia de um piloto escocês, vê-se obrigada a tomar medidas extremas de modo a conseguir sobreviver e sair do país. Conseguirá fazê-lo, mas com um preço elevado em vidas e em experiências traumáticas. Mas o seu trabalho não acabou. Enviada a Lisboa, recebe uma nova identidade e uma nova missão, sob a égide do padrinho. Para a desempenhar, terá de se assumir como uma nova personagem e de se introduzir num meio onde ninguém é o que parece. Mas o passado está mais perto do que julga e o território por onde se move não é tão neutro como aparenta ser.
Parte do que este livro tem de interessante é que, através da perspetiva da protagonista, consegue tornar acessível a complexa teia de relações e intrigas que define a Lisboa onde a maior parte do enredo decorre. Desde os vários serviços de informação às teias de uma suposta neutralidade, passando, naturalmente, pelos movimentos de resistência, pelos meandros do regime e pela dupla identidade de vários dos intervenientes, o que não falta nesta história é intriga e alguns dos seus labirintos são particularmente intrincados. Ainda assim, a forma como tudo é narrado, bem como a proximidade emocional que se vai desenvolvendo, fazem com nunca seja difícil acompanhar todas estas ligações, e com que o crescendo de intensidade resultante das múltiplas movimentações ganhe ainda mais impacto.
Outro aspeto particularmente notável é uma certa ambiguidade que torna tudo mais intrigante. No contexto da história, naturalmente, ou não fosse esta uma narrativa de espionagem, onde ninguém é apenas aquilo que diz ser (mesmo os que parecem realmente sê-lo), mas também no que diz respeito às decisões e aos valores das diferentes personagens. Elizabeth de Mornay e Eduard Graf são, naturalmente, as figuras que mais sobressaem neste aspeto, ela pelas decisões que tem de tomar para sobreviver, ele pela posição que ocupa e pela contradição das suas relações. Mas esta ambiguidade está um pouco por toda a parte, sendo, aliás, também particularmente vincada no sempre intrigante e enigmático padrinho de Elizabeth.
Importa referir, por último, que ficam umas quantas perguntas sem resposta, até porque tudo indica que este livro terá continuidade. Ainda assim, o final revela-se particularmente adequado, não só pela resolução de umas quantas circunstâncias específicas, mas também por parecer sugerir o fim de uma etapa - e o início de uma nova - para as principais figuras da história.
Cativante, intenso, intrincado e fascinante - assim é este Cidade de Espiões. Uma história que demora o seu tempo, mas que nunca deixa de cativar, tanto pelos enigmas e complexidades do enredo como pela força e intensidade das personagens que o povoam. Prende do início ao fim, em suma, e deixa muita curiosidade em saber o que se seguirá.
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