Filha de um rei e a terceira de quatro irmãs, Gwenhwyfar cresceu a ouvir falar dos planos do Rei Supremo e da forma como a magia e o poder moldavam o mundo. Dotada de Bençãos, mas desejosa de ser uma guerreira, Gwen conquistou o assentimento do pai à sua vontade de receber o treino dos guerreios e aproximou-se um pouco mais do seu sonho. Mas, mulher e futura guerreira, Gwen torna-se também uma das mentes mais activas do rei Lleud e, capaz de uma discrição invulgar, observa e compreende que há, agora, forças se movem nas sombras. Pois, enquanto Artur recorre a todos os meios para conseguir um herdeiro, outros poderes conspiram para que isso não aconteça. E é possível que a própria Gwen tenha um papel fulcral a desempenhar no futuro do Rei Supremo - um que, talvez, a obrigue a depor os sonhos em nome do dever.
Apesar de ser também uma recriação da lenda arturiana, ou talvez precisamente por isso, um dos aspectos que mais se destacam neste livro é o facto de o Rei Supremo ter um papel relativamente secundário na narrativa. Muitos dos acontecimentos dizem respeito, de forma mais ou menos directa, a Artur, mas a sua presença efectiva acaba por ser bastante discreta, deixando grande parte do protagonismo às mulheres. Até porque são elas, afinal, que moldam os rumos da história.
Gwen é a grande protagonista e, ainda que a narrativa seja feita na terceira pessoa, é o seu ponto de vista que é apresentado. É possível, pois, acompanhar de perto o crescimento de Gwen, desde a criança determinada que, apesar do conflito com a irmã mais nova e as dificuldades do rumo que deseja, está disposta a ceder em muito para conseguir o que quer, à guerreira capaz que comanda com valor e domina tão bem a estratégia como qualquer homem (ou melhor que alguns) e, por fim, à mulher que renuncia ao sonho para cumprir o seu dever junto de Artur. As suas dificuldades e dilemas, bem como a visão que tem do mundo que a rodeia, são bem construídos e contribuem para que o enredo se mantenha cativante. Isto torna também mais fácil criar uma sensação de familiaridade, bem como uma certa medida de admiração para com a personalidade carismática e determinada, mas com as suas secretas vulnerabilidades, que é atribuída a Gwen, nas múltiplas fases da sua vida. Além disso, o ponto de vista de Gwen permite manter também algum mistério, pois partes do que está a acontecer só lhe chegam ao conhecimento quando as consequências se tornam claras.
Mas nem só de Gwen vive a história, e há muito de cativante na forma como esta se relaciona com as restantes personagens. Desde o conflito com a irmã mais nova à apreensão perante Mordred e à inevitável interacção com Lancelot, a história de Gwen é rica em conflito e emoção, e tão mais fascinante pelo facto de que também as personagens com que interage têm o seu toque de fascínio. A força das personagens contribui, portanto, para dar força e intensidade ao enredo que, escrito de forma cativante e com vários momentos marcantes, cresce em intensidade com o evoluir dos acontecimentos, culminando num final intenso e de grande impacto emocional.
Envolvente, com as medidas certas de acção, emoção, mistério e magia, Gwenhwyfar - O Espírito Branco parte de uma protagonista forte, mas muito humana, para construir uma surpreendente e interessante visão da lenda arturiana. Muito bom.
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