Quis o acaso que, naquela noite, Bernardo salvasse a vida de um assassino. Mas não de um qualquer. Do misterioso B. S., dizia-se que escolhia as suas vítimas entre a escumalha do mundo - chantagistas, abusadores, assassinos - impondo-lhes a sua visão da justiça. Mas, ao salvá-lo, ainda que inconscientemente, Bernardo ficou com um dilema na consciência. Fez bem ou mal? Além disso, está longe de imaginar as razões que movem B. S. Razões essas que lhe estão mais próximas do que poderia imaginar. E mais próximas se tornam quando conhece Vera e descobre que tiveram um amigo em comum - e que nele está a fonte de tudo o que está a acontecer.
Uma boa palavra para descrever este livro seria, sem dúvida alguma, invulgar. E por vários motivos. Em primeiro lugar, o registo pausado, com momentos muito introspectivos, está bastante longe do tom que geralmente se encontra neste tipo de história. Há, aliás, vários momentos em que o mistério na cabeça de Bernardo - quem é B. S. e que razões o movem - passa para segundo plano ante o seu próprio percurso pessoal e os dilemas que lhe pairam no pensamento.
Há também um caminho muito próprio na história do dito B. S., caminho que, embora pareça, por vezes, um pouco rebuscado - principalmente, nas conversas que tem com Bernardo, em que alguns dos diálogos parecem um pouco forçados - , não deixa, ainda assim, de ter bastante de interessante na sua evolução. Além disso, ainda que o rumo geral da história possa não ser especialmente surpreendente, há no acompanhar desse percurso - com todas as questões morais e essenciais que lhe estão associadas - algo de estranhamente cativante.
E depois há as inevitáveis questões que surgem do facto de haver uma personagem a fazer justiça pelas próprias mãos: a possibilidade de errar, a legitimidade de assumir um tal papel, as consequências dessa escolha na estabilidade mental daquele que as faz... Todo um conjunto de perguntas que, apesar da brevidade do enredo, estão bem presentes na evolução da história, contribuindo também para tornar a leitura mais cativante.
Mistério e introspecção funcionam, portanto, como lados complementares na construção deste livro. De uma história que, relativamente breve e de ritmo bastante pausado, acaba por se revelar, apesar disso, estranhamente envolvente. Gostei.
Título: A Cruz do Assassino
Autor: Paulo Bicho Garcia
Origem: Recebido para crítica
Obrigado, Carla Ribeiro, pela sua crítica.
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