Em todas as vidas há um hiato.
A vida do autor parou numa terça-feira como as outras, com um diagnóstico. Quando a vida pára, o mundo divide-se entre os cépticos, que acreditam no acaso, e os que acreditam que os acontecimentos detêm um segredo profundo. Procurar esse segredo não é tarefa fácil. Implica silêncio, um ritmo lento e viajar pela Perda. É um trabalho de memória, de regresso à infância e à nossa história, que passa por livros, objectos, músicas e espaços. Confrontar a vida. Como ela foi. Como nós gostaríamos que ela tivesse sido. A vida, agora.
Escrevo: quatro meses depois. Como se houvesse um momento-marco, um instante zero evidente. Na realidade, as nossas vidas estão cheias de instantes zero, de rupturas, este é só o instante zero mais recente. Sublimamos as outras rupturas, mas, às vezes, numa fracção de segundo, elas emergem. Visitar a Perda é reviver todas as visitas anteriores. É inevitável.
Pensamos que sofremos de coisas diferentes de cada vez, mas é sempre o mesmo sofrimento que visitamos. De modo que escrevo: quatro meses depois. Depois de tudo.
Daniel Simon (Portugal, 1979) viaja, lê e escreve. Interessa-se, em particular, pela Ásia e pelo Médio Oriente. Tem timings estranhos. Gosta de silêncio, de pedras, de mar, de montanha, de gatos e de paisagens e templos desertos.
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