Órfã desde cedo, Catarina não levou muito tempo a reconhecer a sua dependência da bondade - ou dos caprichos - dos outros. Assim, quando foi prometida a um dos filhos do rei de França em nome de uma aliança planeada pelo seu tio, o papa, Catarina não teve escolha a não ser aceitar. Estava, então, longe de imaginar o papel que lhe estava destinado. Perante as dificuldades de uma corte dominada pela amante do marido, onde se sentia ainda e sempre estrangeira, Catarina teve de aprender a afirmar-se. E entre alianças e conflitos, decisões difíceis e derrotas transformadas em vitórias, viria a sacrificar até a sua reputação em nome de França, descobrindo, pelo caminho, uma grande verdade: ninguém é inteiramente inocente.
Bastaria para cativar, neste livro - e é um livro que tem muito de cativante - , a premissa que lhe serve de base. Narrado na primeira pessoa pela voz de Catarina de Médicis, uma das rainhas mais diabolizadas da história, apresenta para a sua vida uma nova perspectiva. E há algo de muito interessante na forma como o autor constrói esta nova narrativa, lançando uma nova luz sobre os factos conhecidos, mas sem diminuir em nada o lado mais negro desses factos. Catarina toma decisões duras - e essas estão bem claras nesta história - e assume as consequências, tanto para o país sobre o qual reina como para a sua reputação.
No fundo, o que o autor faz é criar uma imagem bastante mais complexa - e completa - da figura de Catarina de Médicis, mostrando-a enquanto rainha e, acima de tudo, enquanto mulher. E, ao fazê-lo, constrói uma narrativa intensa e repleta de momentos marcantes, em que a intriga desempenha um papel crucial, mas o mesmo acontece com a emoção, os afectos (com todas as consequências que estes implicam) e até um toque de magia. Tudo se conjuga na perfeição: os factos históricos, a construção das personagens, a narração dos acontecimentos. E, principalmente, a capacidade de humanizar as personagens, mostrando-as como mais do que figuras de estado.
A tudo isto importa ainda acrescentar a escrita. Fluída, cativante, num registo quase confessional, ajusta-se perfeitamente à voz da protagonista tal como o autor a pretende retratar. E, ao fazê-lo, reflecte de forma mais clara as tensões e emoções associadas às diferentes circunstâncias da vida de Catarina, contribuindo, também, para tornar mais nítido o seu retrato.
Retrato de uma época, de um reinado, mas, acima de tudo, de uma mulher, trata-se, portanto, de um romance que lança um novo olhar sobre uma das rainhas mais conhecidas da história. Cativante, equilibrado e muitíssimo bem construído, tanto na narração dos acontecimentos como na caracterização das personagens, um livro que não posso deixar de recomendar. Muito bom.
Título: Confissões de Catarina de Médicis
Autor: C.W. Gortner
Origem: Recebido para crítica
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