Após a sua fuga apressada num comboio de mercadorias, Lou Pirlo pensa que, pela primeira vez em muito tempo, está livre de sarilhos. Mas não é bem assim. Para começar, passa-se algo de estranho com o seu corpo. E, além disso, ao chegar ao suposto porto seguro de Nova Orleães, vê-se envolvido num novo tipo de problemas. Entretanto, também o mundo que deixou para trás está longe de estar pacificado. Os mafiosos não desistiram do seu objectivo e há uma grande vingança em curso. E, como se não bastasse, há um caçador de lobisomens à espreita, cujas motivações ninguém pode controlar.
Um dos desenvolvimentos mais interessantes deste segundo volume é a forma como a partida de uma só personagem dá lugar a uma tão grande dispersão de acontecimentos. A história é muito mais dividida: entre Lou e os novos sarilhos que encontrou, Tempest e os planos da sua família e o plano dos mafiosos para conseguirem finalmente o que queriam. E, sendo certo que esta maior dispersão implica também uma maior brevidade no desenvolvimento de certas relações (principalmente no que toca aos novos companheiros de Lou), surge também uma maior diversidade de contextos. E é interessante ver a forma como isto se reflecte não só nas histórias específicas, mas nos cenários propriamente ditos, com as diferenças de cor a salientar perfeitamente o contraste entre noites escuras e um sol abrasador.
Há também um aspecto particularmente intrigante no que respeita à arte: a forma como a imagem de Lou se altera consoante as circunstâncias. O Lou Pirlo das primeiras páginas é ainda semelhante ao jovem mafioso do volume anterior, mas essa imagem vai-se alterando com o desenrolar dos acontecimentos. E isto é algo de particularmente notável não só porque as situações por que passa são do tipo capaz de deixar marcas, mas também porque há algo a acontecer no seu interior.
E esse algo leva-me ao outro ponto forte: a história propriamente dita. Dividida entre o conflito com os mafiosos e a progressão individual de Lou, tem, desde o início, um ritmo acelerado, em que há sempre algo de relevante a acontecer. E, ainda assim, há lampejos do passado e um ecoar de memórias que acrescentam ao percurso um particularmente marcante rasgo de introspecção. Vista em contraste com o crescendo de intensidade dos acontecimentos centrais, esta espécie de exame de consciência acrescenta como que um instante de quietude, o que gera um contraste particularmente eficaz.
Com o seu contraste de luz e sombra, de um submundo natural e sobrenatural e de uma teia de relações tão efémeras quanto complicadas, prende desde os primeiros instantes e nunca deixa de surpreender até ao muito intenso final. Tudo somado, a impressão que fica é, pois, a de um segundo volume um pouco menos pessoal, mas igualmente intenso e cativante. E cheio de surpresas.
Autores: Brian Azzarello e Eduardo Risso
Origem: Recebido para crítica
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