A poesia, tal como o amor, tem razões que a razão desconhece. E tem meandros, labirintos, profecias, evocações, visões sagradas e profanas, promessas, introspeções, abismos. Mente, alma, coração, corpo, mundo, vácuo, eternidade. Tem tudo em mil formas insuspeitas - e atinge o auge da sua força quando todas estas coisas e mais ganham vasta e abrange voz nas palavras de um só poeta. Vinte anos de poesia - é isso que abrange este Ofício. E são vinte anos vastíssimos.
Não é, por natureza, fácil descrever um livro de poesia, e mais difícil se torna quando o conjunto é tão vasto e as imagens que contém vivem mais de impressões e de evocações do que de algo de concretamente descritível. Há referências familiares, um ambiente tangível: bíblico, a espaços, shakespeariano, por vezes, e outras ainda algo que diverge de tudo e se torna próprio e singular. Mas há, acima de tudo, imagens que se transpõem para a mente e que não são uma forma designável, mas mais como uma evocação mental no interior.
Não é fácil de descrever, portanto, e também não lhe faltam complexidades. Na linguagem, na estrutura, nas sinuosas imagens projetadas. É, de certa forma, como entrar num labirinto, difícil de assimilar por vezes, mas fascinante em todas as suas facetas. E é sinuoso, de facto, mas também muito coeso. Há laços que se replicam através desta longa viagem e uma sensação de que, mesmo que variem as formas, as temáticas, as imagens, a voz é una e singular. E facilmente reconhecível.
Importa referir, por último, ainda um outro ponto singular: a forma como, mesmo nos seus momentos mais crípticos, as palavras parecem adquirir uma vida própria. Não no sentido em que fluem levemente, pois há demasiada densidade para isso, mas no sentido em que se entranham, em que se projetam para o pensamento, em que evocam algo maior nos seus rasgos de brilhantismo. E assim, mais do que uma corrente fluida, fica como que uma figura multifacetada, com um lado indefinível, mas estranhamente cativante.
Vinte anos de poesia abrangem múltiplas obras, muitos temas, inúmeras evocações. E, ainda assim, a imagem que fica é de um todo coeso e completo. De um todo que é mais do que a mera soma das suas partes e que, na sua infinita complexidade, é mais que digno de uma atenta descoberta.
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