Samantha Harper gosta do seu trabalho de jornalista, mas sente-se presa num local onde não a valorizam e castigada pelo chefe por ter cometido o erro de ser mãe. Mas tudo muda ao descobrir uma carta que a avó está a ler. A autora da carta é Ivy Jenkins e a sua história é a de muitas raparigas que acabaram numa casa de acolhimento para mães solteiras. Enviada para St. Margaret para ter o seu filho, escreveu repetidamente ao homem que a seduzira apelando a que a resgatasse desse local cruel. Mas não seria esse o final da sua história. Agora, St. Margaret está prestes a ser demolida e Samantha tem pouco tempo para descobrir os seus segredos. Segredos esses que estão mais perto do que ela imagina...
Tendo no centro de toda a história uma das infames casas para mães solteiras de Inglaterra, onde a brutalidade das freiras era tida como "expiação dos pecados", escusado será dizer que este é um livro com um registo bastante sombrio. É esse, aliás, o primeiro aspecto a marcar, já que é impossível não sentir compaixão face às provações de Ivy e Elvira e à forma como as mais eminentes figuras de St. Margaret sempre acharam ser os donos da razão.
Não faltará, pois, material para reflexão a acrescentar a este impacto emocional, já que, tratando-se embora de uma obra de ficção, é sabido que muitos destes factos têm paralelismos numa realidade não muito distante. É bastante impressionante a forma como a autora consegue construir uma história pessoal para as suas personagens e equilibrá-la com este todo mais vasto, gerando a proximidade necessária para sentir com as protagonistas e, ao mesmo tempo, evocando questões pertinentes como as crueldades impostas em nome da religião ou dos bons costumes.
Mas há ainda um mistério, vindo do facto de todos os principais intervenientes na história de Ivy terem encontrado um fim estranho, e a forma como a autora gere estes elementos, deixando pequenas pistas, mas revelando as coisas a um ritmo gradual e pautado por múltiplas revelações, contribui em muito para tornar a leitura bastante mais intensa. Há muito a desvendar pelo caminho, não só que diz respeito aos segredos de St. Margaret, mas principalmente no que toca às ligações entre personagens. Ligações essas que, embora insinuadas desde cedo, culminam num final particularmente intenso.
Feito de mistério e intriga, mas também das marcas duradouras que a crueldade deixa ao longo de gerações, trata-se, pois, de um livro que parte de um tema duro e difícil para construir uma história surpreendente e repleta de personagens notáveis. Sombrio e memorável, cativa desde cedo e dificilmente se apaga da memória. E é precisamente isso que o torna tão bom.
Título: A Rapariga da Carta
Autora: Emily Gunnis
Origem: Recebido para crítica
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