Vivemos tempos bizarros. Embora as coisas estejam longe de ser perfeitas, dizem as estatísticas que nunca estivemos melhor: há mais saúde, mais segurança, mais paz e mais liberdade, embora certos factores emergentes pareçam apontar para o contrário. E, ainda assim, apesar de tudo o que parece estar melhor, o mundo parece caminhar a passos largos para o desespero. Como se - parafraseando o título - estivesse realmente "tudo f*dido". Então qual é o problema? Para o autor, parece ser a esperança. E, uma vez terminado este livro, uma coisa é certa: nunca mais a esperança será vista da mesma forma.
Sendo um livro classificado como de auto-ajuda ou de desenvolvimento pessoal, há duas coisas que se destacam e surpreendem. A primeira é o facto de ser uma abordagem completamente diferente da que aprendemos a esperar do género: não é simples, não é motivacional, não é um conjunto de dicas fáceis, nem sequer é uma defesa da busca da felicidade. É, pois, um livro que, além de surpreendentemente complexo, segue uma abordagem bastante inesperada e, com isso, consegue apresentar toda uma vastidão de matéria para reflectir. A segunda é o conceito em si: é um livro sobre esperança em que a esperança é basicamente a vilã da história. E o mais estranho em tudo isto é que essa perspectiva faz realmente um certo sentido.
Surpreendente é, pois, uma boa palavra para começar a descrever este livro. Mas há mais qualidades. Há o registo, que oscila entre a afirmação dramática do título e uns quantos laivos de humor verdadeiramente deliciosos (vejam-se as citações de... bem, Einstein). Há a forma como complementa as ideias com dados, factos e também com histórias de grandes figuras, acrescentando exemplos às questões que pretende abordar. E há a organização, que parte de um exemplo de heroísmo para depois se debruçar sobre as diferentes facetas do mundo e das coisas e construir uma nova base de ideais: menos busca de felicidade, mais evolução.
Não é necessariamente fácil assimilar uma visão do mundo construída em torno de uma Verdade Desconfortável, onde quase tudo funciona como uma religião e em que a esperança é contraproducente. Ainda assim, se esta visão desperta uma estranheza inicial, a verdade é que no fim tudo faz um certo sentido. Haverá sempre possíveis pontos de discordância, visões diferentes, uma certa divergência de posições. Mas o que fica é, acima de tudo, muito material para reflexão. E é esse que torna esta leitura realmente notável.
Está muito longe de ser o habitual livro de auto-ajuda que ensina a viver melhor. Mas, à sua maneira, talvez abra portas à possibilidade de viver de forma mais lúcida. E, com as suas ideias peculiares, o seu registo delicioso e a sua visão filosófica e cheia de questões pertinentes, uma coisa é certa: não será um livro fácil de esquecer.
Título: Está Tudo F*dido
Autor: Mark Manson
Origem: Recebido para crítica
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