Filha de uma viúva empobrecida num lugar onde as relações familiares parecem servir de pretexto para a perpetuação do fosso entre ricos e pobres, Missy Wright não tem grandes perspectivas de casamento, até porque não é propriamente uma beldade, muito menos aos olhos de toda uma vasta família de louros. Mas a sorte aparece quando menos se espera e a vingança de uns pode muito bem ser o conto de fadas de outros. A entrada em cena do misterioso John Smith vem pôr a sociedade de Byron em sobressalto, até porque alguém parece estar a comprar misteriosamente as acções da empresa da família. E um estranho, imagine-se! Mas também a própria Missy está pronta para começar a surpreender: farta da monotonia e da resignação ante a vida, começa a descobrir dentro de si uma centelha de desafio que já não a deixa estar quieta. E talvez a intrigante presença de John Smith tenha acendido algo dentro de si...
Uma das primeiras coisas a sobressair nesta história, e provavelmente a sua maior qualidade, é como, ao centrar a narrativa no percurso de Missy, facilmente vêm à tona as injustiças e dificuldades do tempo em que esta história decorre. O meio fechado, em que as coisas se fazem em família porque sempre assim foi (nem que isso implique deixar-se roubar por familiares com mais fortuna e menos escrúpulos), o desprezo dos afortunados que não querem ajudar em contraposição ao orgulho dos pobres que não querem aceitar essa ajuda, a própria visão dos papéis aceitáveis para uma senhora e do comportamento expectável em sociedade - tudo isto são aspectos que, dominantes na história da protagonista, ganham outro impacto pela sensação de opressão quase palpável que é possível sentir em torno de Missy.
É, por outro lado, uma história relativamente breve, e com espaço mais do que suficiente para momentos caricatos e deliciosamente divertidos. O resultado é um equilíbrio muito eficaz entre os temas sérios, como a visão da sociedade da época e as situações mais problemáticas da vida pessoal das personagens, e uma leveza quase que de conto de fadas que promete romance e aventura.
Claro que, ao centrar-se em Missy, deixa, por vezes, certas facetas das outras personagens para segundo plano. Teria, talvez, sido interessante saber mais sobre o futuro da insuportável Alicia após os derradeiros desenvolvimentos ou sobre a vida de John Smith antes de Byron. E é impossível não ficar com alguns sentimentos ambíguos relativamente a algumas decisões de Missy. Ainda assim, a verdade é que todos os elementos essenciais estão lá e conjugados de uma forma tão envolvente que é praticamente impossível parar de ler.
Simples quanto baste, mas com um equilíbrio muitíssimo eficaz entre as histórias de adversidade e as promessas de aventura, trata-se, pois, de uma história que, passada num tempo diferente, conjuga temas que nunca deixam de ser actuais e sentimentos intemporais. Poderia, talvez, ser um pouco mais longo? Sim, mas resulta lindamente tal como é.
Título: As Senhoras de Missalonghi
Autora: Colleen McCullough
Origem: Recebido para crítica
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