quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

A Quinta dos Animais (George Orwell)

Tudo começou com um sonho e um discurso, e, à primeira oportunidade, os animais tomaram conta da Quinta do Infantado, expulsando os humanos e recuperando o controlo das suas vidas. Mas a Rebelião foi apenas o início. Liderados por dois porcos, os animais definem os mandamentos que deverão reger o seu regime e as regras a aplicar à população da recém-rebaptizada Quinta dos Animais. E o que inicialmente pareciam ser regras claras transforma-se em algo bastante mais complexo, à medida que a esperança de trabalhar com vista a uma vida melhor se esbate num regime cada vez mais sombrio e autoritário, dominado pelo ambicioso Napoleão.
Não é propriamente difícil de adivinhar que esta história está muito longe de ser apenas uma fábula sobre animais que decidem libertar-se do jugo dos humanos. É muito mais do que isso. É o retrato do nascimento e ascensão de um regime autoritário e também uma reflexão sagaz sobre todos os autoritarismos. E, sim, começa por ser uma história aparentemente leve e ligeiramente caricata sobre animais que falam e que aspiram à liberdade. Mas a marca vai-se entranhando à medida que o lado sombrio desta história - em si mesma e também com os evidentes paralelismos com o mundo dos humanos - começa a vir à tona.
Basta esta perspectiva - e, claro, a mestria em que toda esta impressionante construção assenta - para fazer deste livro uma obra relevante. Mas há mais a destacar. A escrita que, embora bastante descritiva, flui com uma precisão tal que quase parece perfeitamente natural a interacção entre porcos, cavalos, cães e restantes animais da quinta. A construção das personagens, que, embora representativas de uma realidade bem diferente, têm também personalidades e peculiaridades próprias. E a visão de um todo que é muitíssimo mais vasto... mas que é também uma história tão estranhamente cativante que, mesmo conhecendo a realidade e adivinhando, por isso, aquilo que virá, é impossível não torcer por uma conclusão mais benéfica para os animais envolvidos.
E é curiosa esta sensação que vai surgindo: por um lado, reconhecemos o regime que inspirou a história, os problemas, as personagens. Por outro, há uma certa e inevitável leveza - talvez devido ao facto de ser uma história protagonizada com os animais - que contrasta com o crescendo de negrura que marca a ascensão do porco Napoleão. Como se houvesse um outro fim possível, uma revolução dentro da revolução. 
O resultado é um livro intemporal, pois, embora retratando um regime muito específico, contém muito de pertinente para a análise de todos os autoritarismos. E também uma leitura cativante, surpreendente e tão capaz de marcar por aquilo que representa como pelos simples passos da história em si. Breve, mas notável em todos os aspectos, um livro que todos deviam ler.

Autor: George Orwell
Origem: Aquisição pessoal

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