terça-feira, 5 de julho de 2011

Pensei que Tinhas Morrido (Pete Nelson)

Nada na vida de Paul Gustavson parece correr como devia. O pai sofreu um AVC. A namorada tem uma relação com outro indivíduo. A situação profissional é instável. E a sua posição perante o mundo é, no mínimo, sombria. Mas entre todas as dificuldades, Paul tem um único refúgio na figura constante de Stella, a sua companheira. E acontece que Stella é uma cadela já de bastante idade e que... fala. Mas só com Paul, claro.
Importa dizer, antes de mais, que este livro não é a clássica história de como a entrada de um animal de estimação especial muda a vida de um humano. Não. Esta não é a história de Stella e de como ela alterou a vida do seu dono. Esta é a história de Paul e do seu percurso de vida, um percurso de altos, baixos e muito baixos que inclui Stella no seu caminho. Claro que a presença de Stella é, em vários momentos, algo de essencial, porque as conversas que esta tem com o seu humano funcionam, muitas vezes, como a voz da sua consciência, e também pelo momento de grande intensidade emotiva e ponto de viragem que esta protagoniza. Ainda assim, é em Paul que a história se centra e Stella é apenas um - ainda que um dos melhores - elementos que a constituem.
Algo de particularmente marcante é a forma como o autor reflecte as emoções do protagonista. O tom geral é, inevitavelmente, sombrio, já que o caminho de Paul é difícil e marcado pela tristeza. Ainda assim, há algo na forma como as dificuldades e as reacções (ou falta de) são apresentadas, com as medidas certas de humor, emoção e reflexão, que cria um nível de empatia e, ao mesmo tempo, transmite algo de familiaridade. Afinal, numa ou noutra fase, todos passamos por momentos mais difíceis.
Ainda de referir o lado introspectivo da narrativa. Escrito na terceira pessoa, é ainda assim algo de bastante pessoal. É fácil reconhecer aquela impressão de sermos algo diferente do que os outros vêem, quer porque não ousamos mostrar o que somos, quer porque nós próprios não vemos aquilo em que nos transformamos. E é, em grande parte, esta reflexão que dá força à narrativa. Da relação familiar de Paul, das dificuldades amorosas, da incapacidade de reagir perante a perda... há sempre algo de próximo, algo de conhecido que poderia ter acontecido a qualquer um.
Envolvente, com momentos de grande ternura, mas também com algumas situações divertidas, uma história onde os afectos e as relações (em todas as suas múltiplas formas) servem de base ao traçado de um percurso que, ainda que com uma dose saudável de exagero, poderia ser próximo ao de qualquer um. Muito bom.

1 comentário:

  1. Com uma opinião destas até apetece ler Carla e acredita que este não era um livro que atraísse :)

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