terça-feira, 13 de novembro de 2018

Moonshine, Vol. 1: Sangue e Whisky (Brian Azzarello e Eduardo Risso)

Quando, em plena vigência da lei seca, Lou Pirlo é enviado pelo seu chefe para fazer um acordo com um homem que parece produzir uma bebida particularmente potente, Lou sente que está finalmente a merecer um pouco da confiança que sempre almejou. Mas as coisas não tardam a descontrolar-se. Holt, o homem que procura, é uma personagem estranha e o mesmo se aplica à família que o rodeia. Pior, não está nem um bocadinho interessado em fazer acordos. Já o chefe de Lou não aceita um não como resposta. E há coisas estranhas a acontecer - coisas fatais. E insistir em ficar, mesmo que seja por não ter alternativa, pode trazer a Lou consequências dramáticas.
Todos conhecemos uma ou outra história de mafiosos: fatos, armas, negócios obscuros e propostas... irrecusáveis. Também já ouvimos ou lemos histórias de lobisomens, com as suas transformações em noites de lua cheia e as ferozes consequências que daí resultam. Tudo interessante, certo? Agora imagine-se uma história em que estes dois elementos se combinam - e de forma poderosamente eficaz. O resultado é uma leitura viciante, intensa e cheia de surpresas.
Basta esta premissa e a forma como é desenvolvida para tornar a leitura cativante. Ao ambiente tenso juntam-se grandes momentos de acção, uma aura de mistério que confere a cada revelação um grande impacto e um emergir de possibilidades a cada novo desenvolvimento. Bastaria isto para que a leitura valesse a pena, até porque, com o seu ritmo intenso e personagens intrigantes, a história é praticamente irresistível. Mas há dois aspectos que importa destacar: a arte e a construção das personagens (principalmente do protagonista).
Da arte, sobressai a forma como reflecte na perfeição o contraste entre os dois mundos. Os fatos elegantes, a pose das personagens citadinas, as expressões sobranceiras (em oposição às expressões que surgem... noutras circunstâncias) evocam perfeitamente o ambiente das histórias de mafiosos. Até na cor isto se sente. E depois há o sangue, o fogo, as trevas, as grandes cenas de acção e violência naturalmente associadas à natureza feroz dos lobisomens. Poderiam ser dois mundos diferentes, mas surgem juntos neste livro - e que bem que eles ficam juntos.
Da construção de Lou, destaca-se uma estranhamente fascinante ambiguidade. O papel que desempenha, a relação com os seus "donos" e a forma como interage com algumas das outras personagens, fazem de Lou o tipo de figura que não desperta propriamente empatia instantânea. E mais, com o desenrolar da história, as complexidades começam a vir à tona, mas desengane-se quem espera uma transformação em herói. Lou é moralmente ambíguo e, curiosamente, é isso que o torna tão interessante. Pois, mesmo nos momentos de cobardia, de (tentativa de) manipulação e de pura e simples indiferença, há algo nele que nos faz querer saber mais. E, quando a vulnerabilidade surge... bem, é nesses momentos que o melhor de Lou se manifesta.
Somadas as partes, fica a impressão do mais promissor dos inícios. Intenso, cheio de surpresas, visualmente fascinante e com uma história capaz de fundir dois mundos num equilíbrio praticamente perfeito, deixa uma vontade quase irresistível de descobrir o que acontece a seguir. E é também dessa matéria que as melhores séries são feitas. 

Autores: Brian Azzarello e Eduardo Risso
Origem: Recebido para crítica

Sem comentários:

Enviar um comentário