O plano era converter animais em máquinas de matar para que estes pudessem travar as guerras em vez dos humanos. E os primeiros testes correram como esperado, aproveitando-se também o pretexto para livrar o mundo de um ou outro ditador. Só que o plano mudou e os três animais usados - um cão, um gato e um coelho - deverão ser agora desactivados. Mas eis que surge a oportunidade de fuga, e tudo o que eles querem é voltar para casa. Perseguidos pelos seus criadores, as armas que os compõem ser-lhes-ão essenciais à sobrevivência. Mas será a descoberta de que não são apenas aquilo o suficiente para os salvar? E onde é "casa", depois de tudo o que lhes foi feito?
Poder-se-ia pensar, à primeira vista, que a ideia de três animais que tentam regressar a casa poderia dar origem a uma história fofinha, mas... não. Não é bem isso. O que este livro apresenta é algo bastante mais complexo, onde converge a visão quase inocente e enternecedora de um animal de estimação que só quer regressar a casa (e há momentos, principalmente protagonizados pelo cão, que são realmente lindos) com a violência desmesurada dos seus criadores e também do que fizeram deles. Abundam, por isso, as imagens de sangue e entranhas... e também os rasgos de emoção, no que acaba por ser uma surpreendente convergência de opostos.
Além deste contraste, outro dos aspectos que tornam esta leitura notável prende-se com a forma como grandes partes da história são vistas do ponto de vista dos protagonistas animais. A forma de comunicação e a forma de pensamento são totalmente distintas das dos momentos em que participam os humanos, o que realça tanto as diferenças como os pontos em comum. Além disso, e sendo principalmente a história de uma fuga (e de uma perseguição), trata-se também de um livro cheio de acção, o que faz com que sobressaiam também as peculiaridades do desenho destas cenas.
O que me leva, claro, a outro ponto que importa realçar: a arte. É uma história que vive mais de acontecimentos do que propriamente dos diálogos (embora haja também alguns diálogos notáveis) e, assim sendo, torna-se crucial a componente visual. Componente essa que surpreende pela diferença, quer na expressividade das personagens (e, mais uma vez, principalmente do cão), quer nas impressionantes cenas de acção que tão facilmente transmitem a intensidade das circunstâncias.
Surgem, naturalmente, algumas limitações devido ao facto de a história se concentrar fundamentalmente na fuga, nomeadamente na curiosidade que fica relativamente à construção do projecto e a algumas das personagens humanas. São, ainda assim, aspectos secundários face ao impacto desta grande e intensa fuga, que culmina num final que, não dando todas as respostas, dá todas as que são realmente necessárias.
Simultaneamente sombria e comovente, trata-se, pois, de uma história intensa, cativante e cheia de surpresas. Além, é claro, de um retrato estranhamente certeiro do contraste entre a possível crueldade humana e o afecto incondicional dos animais. Marcante e surpreendente, um bom livro, em suma.
Título: WE3
Autores: Grant Morrison e Frank Quitely
Origem: Recebido para crítica
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