quarta-feira, 2 de maio de 2012

O Circo dos Sonhos (Erin Morgenstern)

Le Cirque des Rêves chega sem avisar, não deixa sinais da sua passagem e aparece e desaparece como se pôr magia. Abre ao cair da noite e encerra de madrugada e contém no seu interior um mistério que nem os seus protagonistas compreendem por completo. É que aquele lugar de múltiplas e maravilhosas tendas onde o improvável se torna possível é também o cenário de um desafio que opõe os discípulos de dois mestres da manipulação. O problema é que há demasiadas pessoas envolvidas no que devia ser um duelo e a oposição entre Celia e Marco acaba por seguir um rumo bastante diferente do que os seus mestres teriam desejado.
É a complexidade do ambiente criado pela autora e a naturalidade com que esta o desenvolve o que, desde logo, fascina nesta leitura. O tom é, desde o início, de mistério, mas a forma como o circo é gradualmente desenvolvido, apresentado ao leitor ao mesmo ritmo a que as próprias personagens assimilam a verdadeira dimensão das suas complexidades, cativa e surpreende a cada nova revelação. O ponto de partida é um ambiente em que a magia está presente, mas o mundo não vê - ou não quer ver, o que queria uma interessante base para uma história em que, por vezes, Celia e Marco (e os seus mestres) parecem ser os únicos verdadeiros conhecedores das artes mágicas, mas onde a sua verdadeira influência em tudo o que os rodeia não deixa de surpreender. A própria natureza do circo, com todos os seus mágicos pormenores, reforça essa magia cuja presença se vai impondo gradualmente.
Ainda que a história central pareça ser a do desafio entre Celia e Marco - e são estes, de facto, os intervenientes principais dos momentos mais marcantes da história - o circo acaba por se revelar como o verdadeiro protagonista. A forma como este evolui com as acções de cada um dos adversários, como a sua criação acaba por influenciar a vida e a sanidade dos seus criadores e, principalmente, a forma como acaba por se manifestar também no fascínio que exerce sobre os seus visitantes fazem com que Le Cirque des Rêves seja muito mais que um cenário ou uma arena, mas quase uma entidade que ganha vida própria.
Também na escrita há muito de cativante. O ritmo é relativamente pausado, principalmente devido às ocasionais descrições pormenorizadas no respeitante aos pormenores do circo, mas o rumo da história nunca perde a envolvência e, ao completar a história de Celia e Marco com as interessantes relações entre personagens aparentemente secundárias, a autora cria um enredo que gradualmente evolui no sentido de uma conclusão intensa e surpreendente, onde as linhas de todas as personagens se cruzam para dar forma a um final em que tudo faz sentido. Final que foge também às possibilidades que pareciam, ao longo da narrativa, ser as mais prováveis, concluindo de forma surpreendente - e, ainda assim, no que parece ser o fim mais adequado - tanto a história das personagens como a do lugar onde se movem.
Com uma história cativante, personagens complexas e carismáticas e um equilíbrio perfeito entre mistério e emoção, acção e caracterização, ambiente e personagens, este é um livro que fica na memória tanto pelo maravilhoso do cenário que apresenta como pela força e empatia das suas personagens. Belíssimo e com uma escrita soberba, um livro impressionante.

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