segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Uma Espia na Casa do Amor (Anaïs Nin)

Dividida entre a necessidade de ser livre e o desejo de amar, Sabina foge a um casamento em que vê o marido mais como um pai bondoso do que como um amante e procura o fogo da paixão junto de outros homens que vai conhecendo. No seu percurso, constrói uma teia de mentiras, dando forma a uma mulher diferente, moldada em cada um dos múltiplos aspectos da sua personalidade. Mas para cada aventura há também algo que falta e o fardo cada vez mais pesado de uma culpa que, ao mesmo tempo, quer expiar e evitar. 
Conjugando sensualidade e introspecção numa narrativa que é, em simultâneo, um percurso através das múltiplas aventuras da protagonista e o caminho até à tomada de consciência e redenção, este é um livro em que, muitas vezes, o que é sentido e a análise desse sentimento se confundem. Sabina é uma mulher complexa, dividida nos seus múltiplos aspectos, quase como de cada um deles emergisse uma mulher diferente. É, por isso, uma mulher de emoções e posições ambíguas, o que se reflecte também nas suas relações e na forma como são narradas. A impressão que fica é, por isso, a de uma estranha dança, por vezes confusa, mas também intrigante, e de um caminho tortuoso em direcção à possível resposta.
Nem sempre é fácil acompanhar as escolhas e as motivações da protagonista. Além disso, as relações que estabelece têm sempre algo de efémero ou de incompleto, o que, apesar de adequado ao percurso de Sabina, cria também uma impressão de distância. Distância essa que é compensada pelo mistério, já que, acima de tudo, a imagem que fica é a de Sabina enquanto enigma, mas que, ainda assim, torna a sua personalidade menos empática.
Mas há um elemento que sobressai, acima de toda a ambiguidade e das complexidades da forma de vida da protagonista. É que, no registo introspectivo em que sentidos, reflexão e sentimento se confundem,a voz da autora surge com uma fluidez brilhante. Poética a espaços, directa quando necessário, mas sempre de uma profundidade que acompanha o enredo, a escrita da autora é bela e cativante, mesmo quando o que é narrado não é assim tão claro.
Mais que uma história de múltiplas relações, Uma Espia na Casa do Amor é, acima de tudo, um percurso de descoberta e, talvez, de uma possível redenção. Um caminho em que, sendo a reflexão tão ou mais importante que a experiência, a dispersão de pensamentos e de vivências acaba por fazer sentido, numa leitura que, entre a estranheza e o fascínio, acaba por ficar na memória.

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