Acaba de começar o novo ano e ainda se ouve o barulho das comemorações quando Duarte recebe a chamada de um amigo do seu avô. O motivo da chamada é um misterioso envelope que o avô lhe deixou, a ser entregue apenas no ano de 2017. E, com tanta curiosidade como o portador da estranha mensagem, Duarte não hesita em deixar tudo para trás e rumar ao Baleal, onde o aguarda o misterioso envelope, com uma chave e um mapa no seu interior. Ora, chave e mapa são apenas a primeira pista para o que consta ser a localização de um tesouro que motivou muitas histórias. E é nessas histórias que estão as pistas para a verdade do estranho tesouro: histórias de amores proibidos, de nazis em fuga, de piratas e romanos e de uma baleia que engoliu um espanhol - que afinal era castelhano e não se sabe bem se foi ou não engolido.
Basta uma olhadela à sinopse deste livro para perceber que há muitas e estranhas histórias no seu interior. E, porém, o livro não chega às duzentas páginas. Estranho? Talvez um bocadinho e, por isso, talvez se espere encontrar histórias contadas à pressa, talvez com muitos aspectos deixados por explorar. Será? Não. Não é. E este é um dos grandes pontos fortes deste (relativamente) pequeno livro: é que, apesar da brevidade, tudo tem precisamente a medida certa. Não, não ficamos a conhecer a fundo a vida e os dilemas interiores das personagens, mas também não é propriamente esse o objectivo. É de uma aventura que se trata, afinal. Ah, e que aventura...
Continuando nos pontos fortes e nas muitas histórias que se entrelaçam nesta aventura, há um aspecto curioso que importa destacar. Num dos vários enredos construídos em torno do misterioso tesouro, um dos protagonistas é um monge que, qual Sherazade, utiliza as suas histórias para prender a atenção da sua amada, deixando sempre uma ponta para contar no dia seguinte. E, curiosamente, o autor faz várias vezes o mesmo neste livro, saltando entre os vários enredos para expandir a história do tesouro, ao mesmo tempo que deixa o leitor suspenso do que poderá ter acontecido àquela personagem em específico. Claro que a curiosidade é irresistível e as páginas vão passando quase sem se dar por elas, pois é preciso saber logo o que se segue. E assim a história flui ao ritmo do vício de se saber mais.
Mas ainda há mais a dizer. É que, além da forma de contar as histórias, também as próprias histórias têm muito de intrigante... e de peculiar... e, acima de tudo, de divertido! E, vistas como um todo, ao ritmo do percurso de Duarte na sua busca pelo tesouro, ganham ainda uma maior dimensão, pois criam uma teia de memórias que é, além de uma aventura muito intensa, uma viagem ao mundo da nostalgia. Quem não gostava de ouvir histórias em pequeno, afinal? Histórias como estas - tesouros, piratas, reis e as suas batalhas... - e outras que este livro acaba por fazer lembrar.
Ah, e quanto à história do tesouro? Bem, essa não posso contar, não é? Mas importa dizer isto: numa aventura onde tudo é, de alguma forma, surpreendente, também o final não podia deixar de o ser. E, mais do que isso, é também a conclusão mais adequada para esta história toda ela feita de histórias dentro de mais histórias.
Leve, breve, intenso e muito divertido: é este, portanto, o retrato que fica deste livro. Uma aventura que salta de história em história para nos lembrar que o maior dos tesouros nem sempre é aquele que mais brilha. Muito bom.
Título: A Baleia que Engoliu um Espanhol
Autor: Marco Neves
Origem: Recebido para crítica
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