terça-feira, 19 de outubro de 2010

O Contador de Histórias (Rabih Alameddine)

Depois de longos anos passados na América, Osama al-Kharrat regressa a Beirute. A morte do pai está próxima e é o seu dever estar com ele nesse momento difícil. E é desde este ponto de partida que se inicia uma viagem através do passado de Osama e dos seus ancestrais, recuando até ao seu avô, um reputado hakawati, e às principais histórias que ele contou.
Histórias dentro de histórias dentro de histórias. Se há coisa que não há neste livro é um enredo linear. O autor avança e recua na linha temporal, consoante julga adequado à sua voz narrativa, ao mesmo tempo que percorre espaços tão diferentes como o Líbano dos tempos de guerra e o mundo dos mortos do jinn Afreet-Jehanam. E são histórias tão diferentes como a de Fátima e o seu desafio ao jinn, de Baibars, o escravo que se tornou sultão e, claro, de Osama e dos seus antepassados, que definem um enredo complexo, onde histórias a recordar as mil e uma noites e outras próximas do mundo real se entretecem para criar um livro intenso, ainda que não de leitura compulsiva, e onde cenários e situações se conjugam na medida certa de descrição, acção e emoção.
As frequentes mudanças de tempo e de espaço, bem como a necessidade de seguir várias linhas históricas em simultâneo, fazem com que esta não seja propriamente uma leitura fácil. Ainda assim, a beleza da escrita nos seus momentos mais descritivos, a intensidade das situações mais comoventes e a curiosidade que cada pequena história desperta compensam amplamente o esforço inicialmente necessário em termos de concentração. É também um livro onde há muito que aprender, tanto no respeitante às lendas e costumes, como ao próprio cenário de guerra que, ainda que não seja particularmente desenvolvido, surge como um ambiente marcante e perturbador.
Num livro onde tantas histórias ganham vida, é ainda necessário referir o final, que, não sendo propriamente conclusivo, já que deixa em aberto algumas perguntas e possibilidades, parece fechar no ponto mais adequado, deixando para a imaginação do leitor a formulação dessas histórias que o tempo sempre deixa por contar.
Profundamente belo e envolvente, ainda que exigente e algo complexo na conjugação das suas histórias, um livro que marca, por emoções e pensamentos, e que, na vastidão dos mundos contidos no seu interior, não perde aquele toque pessoal com que o leitor se poderá identificar. Muito bom.

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