quarta-feira, 14 de maio de 2014

O Homem que Perseguia o Tempo (Diane Setterfield)

Nos seus tempos de rapaz, William Bellman lançou a pedra que matou uma gralha-calva. Foi um momento que se tornou quase uma lenda no círculo dos seus amigos de então, mas que, ao mesmo tempo, caiu num quase esquecimento. William cresceu e, com a idade, veio a determinação. Primeiro sob a orientação do tio e depois pelos seus próprios meios, a dedicação e o raciocínio arguto destinam William a grandes coisas. Mas há uma presença ao longo do seu percurso, uma que se torna mais visível no caminho de cada perda. E quando um acordo feito nas sombras de um cemitério lhe lança uma nova oportunidade, William sabe que tem um novo desafio à espera. Um que talvez não tenha interpretado correctamente.
Diferente, em muitos aspectos, de O Décimo Terceiro Conto, este é um livro que tem em comum com ele apenas a sempre presente aura de mistério e uma escrita envolvente e com momentos de rara beleza. Em tudo o mais, o que sobressai são as diferenças, com a emoção e a empatia a dar lugar a uma maior distância, em que é o o que predomina é o pressentimento de algo ominoso e uma muito particular visão do tempo - e do que se escolhe fazer com ele.
William Bellman está muito longe de ser o que se consideraria uma personagem capaz de gerar empatia, apesar de o fazer, nos seus melhores momentos. Centrado numa necessidade o mais racional possível (do seu ponto de vista) de tentar encontrar soluções para tudo, William é, durante a maior parte do tempo, uma personagem distante, com rasgos pontuais de emotividade, é certo, mas centrado, acima de tudo, no trabalho. É, aliás, a esta forma de ser que se deve a sensação de distância que se percebe durante grande parte do enredo.
Mas é também devido a esta forma de ser que a lição de Bellman sobressai. Confrontado com sucessivas perdas e sucessivas obsessões, o protagonista é a base de toda uma reflexão sobre o que realmente importa na vida. Nesta perspectiva, o principal papel do elemento (quase) sobrenatural acaba por ser também o de um meio para moldar a mensagem, além do de fonte principal da tal aura de mistério que, mesmo nos momentos mais descritivos, mantém a envolvência da narrativa.
E depois há a escrita, fluída e cativante, ajustada em ritmo e em tom ao fluir do enredo. Acaba por ser fácil imaginar William Bellman debruçado sobre o seu trabalho incessante ou atormentado pelas coisas que não consegue assimilar, porque, mesmo numa história narrada na terceira pessoa, a autora dá voz à sua personalidade.
Dificilmente poderia ser um livro mais diferente de O Décimo Terceiro Conto. Mas, com uma grande mensagem e um bom protagonista no centro de uma história intrigante, este é também, na sua própria forma, um livro memorável. E que não posso deixar de recomendar.

2 comentários:

  1. Gostaste mesmo deste título? Interessante...

    Já agora, é a primeira vez que cá venho. Keep up =)

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    1. Gostei! Reparei que desiludiu muita gente, principalmente entre quem gostou muito do outro livro da autora, mas, no que me diz respeito, encheu-me as medidas. :)

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