sexta-feira, 10 de abril de 2020

Apologia de Sócrates (Platão)

Aos setenta anos, Sócrates foi levado a julgamento, sob a acusação de não crer nos deuses e corromper a juventude ateniense. Seria esta acusação que o levaria à morte. Este livro traça o discurso da sua defesa, a de um sábio que assume o que não sabe e que, serenamente, desmonta ponto a ponto a incoerência das acusações. Pese embora o conhecimento prévio da possibilidade de que isso para nada sirva.
Não é preciso mencionar a importância deste livro. Todos falámos - quanto mais não seja nas aulas de filosofia - em Sócrates e Platão. Mas o que surpreende neste discurso é, acima de tudo, a intemporalidade. Passaram milénios e as questões mantêm hoje a mesma exacta pertinência. O que é a verdadeira sabedoria, o que sabem realmente os que julgam saber tudo, de que forma o questionar corrompe, como podem as calúnias e insinuações causar o descalabro de uma ou várias vidas e levar a julgamentos precipitados... tudo isto está presente neste pequeno, mas tão vasto livro, e não apenas no discurso propriamente dito, mas também na forma como este retrata a delicadeza da situação.
Outro aspecto que pode ser surpreendente, principalmente se o compararmos com alguns textos filosóficos mais herméticos, é a acessibilidade. É um discurso, afinal, e facilmente se imagina a ser proferido em voz alta. É, aliás, quase impossível não imaginar, ao lê-lo, a figura do filósofo a proferir estas tão perspicazes palavras ante os seus juízes. E, além desta imagem mental, destaca-se ainda outro aspecto: a clareza com que as ideias se assimilam face a uma tão grande clareza.
Há ainda um último ponto particularmente marcante, que é a reflexão sobre a natureza da morte. É algo de particularmente impressionante encontrar num discurso que, para os devidos efeitos, será o de alguém que se encontra perante uma sentença de morte, a reflexão sobre a incerteza de se tratar ou não de algo mau. Sendo a morte o grande mistério, é impossível não ficar a pensar nas palavras aqui proferidas pelo grande Sócrates. E não será esse também o objectivo da filosofia? Fazer pensar?
Um grande livro nem sempre precisa de ser longo para ser memorável. É o caso desta obra intemporal: pensamento filosófico sob a forma de um discurso de defesa, de uma clareza e profundidade notáveis. Nem é preciso dizer que vale a pena, neste caso. É um livro que todos deviam ler.

Autor: Platão
Origem: Recebido para crítica

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