A vida de Constança divide-se entre dois mundos: a cidade do Porto, onde tem o seu trabalho numa grande empresa de informática e o namorado com quem vive há vários anos, e a aldeia de Cabeceiro onde tem os pais, o irmão e o lugar a que sempre adora regressar. E, embora o irmão esteja a passar por uma fase difícil, que necessariamente traz perturbações a todos, a vida de Constança define-se por uma relativa tranquilidade. Mas tudo muda quando o trabalho a leva a passar alguns meses no Algarve. Aí, no hotel onde passará algum tempo a trabalhar, fará novos amigos e conhecerá pessoas importantes para si. Mas descobrirá também que o coração não é tão firme quanto julga. E posta à prova nas suas escolhas sentimentais, Constança terá de escolher entre o que conhece e o futuro possível - ou de deixar para trás uma parte de si.
Provavelmente o grande ponto forte deste livro é a escrita que, num registo bastante intimista, pese embora a grande componente descritiva, consegue realçar rotinas e divergências sem nunca perder de vista a humanidade das personagens que apresenta. Nem sempre é fácil compreender as personagens e algumas das decisões de Constança não são propriamente as mais fáceis de compreender. Ainda assim, a forma como o autor dá voz à história consegue atenuar estes sentimentos de distância progressiva, mantendo sempre acesa a vontade de conhecer melhor as personagens e o mundo que habitam.
Também bastante interessante é a forma como as personagens conseguem surpreender. Ainda que seja Constança a protagonista, está longe de ser a figura mais cativante e, embora a sua história seja o centro de tudo o resto, são os outros quem mais marca neste caminho. Ora, isto tem dois aspectos a realçar: primeiro, o facto de haver gente marcante na história, mesmo que nem sempre se goste lá muito da protagonista. E segundo, o facto de ninguém - nem Constança nem os outros - ser perfeito. É, aliás, nas vulnerabilidades que se revela o mais marcante das personagens, o que acaba por deixar uma estranhamente agradável sensação de intimidade relativamente a elas.
É uma história de amor, ainda que não de um romance arrebatador. E talvez por isso é o aspecto romântico que acaba por impressionar menos. A forma como a relação de João e Constança evolui não é propriamente algo de imprevisível. Mas há mais para lá do romance - a vida familiar, o quotidiano da aldeia em contraste com a vida na cidade, os problemas de um desgosto capaz de apagar a vontade de viver e a forma como isto se repercute nos outros - e são estes aspectos aparentemente secundários que, associados ao percurso da protagonista, tornam toda a jornada memorável. E depois há ainda o complemento das fotografias que, na sua aparente simplicidade, acrescentam mais vida à narrativa.
A impressão que fica é, por isso, a de um livro que, apesar do ritmo relativamente pausado, consegue cativar pela forma como conta as coisas e, principalmente, pelo entrelaçar das diferentes facetas das suas personagens. Envolvente, bem escrito e com vários momentos memoráveis, uma boa leitura.
Título: Voltar a Ti
Autor: José Rodrigues
Origem: Recebido para crítica
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