sábado, 5 de setembro de 2020

Observação da Gravidade (André Osório)

Longas paisagens e pequenos fragmentos. Imagens que se projectam para o interior e pensamentos que, aparentemente simples, quase parecem conter uma vida inteira. Longas deambulações por sequências de gestos ligeiramente surreais e breves imagens surpreendentemente certeiras. É de um pouco de tudo isto - e mais - que é feita esta Observação da Gravidade. Gravidade que não afecta apenas os corpos, mas também a mente.
Não é propriamente fácil descrever este livro, até porque o seu ponto mais forte está no facto de gerar sobretudo impressões e sensações fortes, mais do que propriamente percepções racionais. E isto é em si mesmo uma surpresa, porque, se olharmos para os versos tal como eles são, parece haver uma firme base objectiva - paisagens, objectos, gestos - mas projectada para algo de diferente, de indefinível interioridade. É o tipo de livro que dificilmente se defina, mas que deixa várias pegadas na memória.
Talvez seja possível, apesar disso, olhar um pouco para a estrutura. E a estrutura é relativa. Há poemas de várias páginas e outros de apenas três versos. Poemas com ritmo definido e com a cadência do pensamento. Poemas com rima e sem ela. À imagem das paisagens relativamente reais, relativamente surreais que evoca, também a estrutura vagueia ao ritmo das sensações. E, assim sendo, há poemas mais longos, mas que parecem dispersar-se um pouco e, outros que contém tudo aquilo de que precisam nas suas escassas linhas. E, entre uns e outros, há todo um espectro de impressões e possibilidades.
É também um livro breve, o que, associado aos pontos comuns entre poemas, realça a sensação de união que liga as partes. Cada poema é um todo independente, mas o conjunto parece ter sido pensado como um todo coeso, ou pelo menos é essa a impressão que fica: a de uma totalidade que é maior do que a soma das suas partes.
Observação da Gravidade: de uma gravidade interior, possivelmente. E é esta gravidade interior, tão perto do mundo, mas traçada de uma forma tão singular, que torna esta leitura memorável. Difícil de descrever, é certo... mas marcante, sem dúvida.

Autor: André Osório
Origem: Recebido para crítica

Sem comentários:

Enviar um comentário